A Paz de Cristo
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- Segunda, 04 Junho 2018 11:40
Antes de receber o Pão eucarístico, maior riqueza para os cristãos, eles se saúdam com um gesto de fraternidade dizendo: “A Paz de Cristo!”. De fato, a paz é um dom precioso e condição inequívoca para se entrar em plena comunhão com o Senhor. Como poderia receber em si, misticamente, a pessoa do Salvador, se não acolhesse, não perdoasse, não aceitasse, não amasse seu irmão, mesmo se este fosse seu inimigo? Ao momento da instituição da Eucaristia, às vésperas de seu sacrifício na cruz, o Mestre ensinou a seus discípulos seu único mandamento: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei” (Jo 13,34). Anteriormente, havia sido ainda mais explícito: “Amai os vossos inimigos, rezai pelos que vos perseguem” (Mt 5, 44).
Quando acontecem situações conflituosas, a paz fica ameaçada. Muitas pessoas se deixam levar pela tentação da vingança, e, descuidadamente, podem cair nas malhas do ódio ainda que disfarçado. É preciso atenção, pois tais atitudes são obra do maligno. Entre os Apóstolos houve também esta experiência negativa. Ao ver a absurda injustiça que os poderes públicos faziam contra Jesus, ao momento da prisão de seu Mestre, um de seus discípulos apelou para a violência. Arrancou sua espada da cintura e chegou a ferir Malco, um dos servos do Sumo Sacerdote, cortando-lhe a orelha. Cristo o repreendeu com veemência: “Embainha tua espada, pois todos os que usam da espada, pela espada morrerão” (Mt 26, 51).
O nascimento de Cristo foi anunciado pelos anjos que cantaram, e nós ainda cantamos: “Glória a Deus nas alturas e paz na terra a todos os que o amam” (Lc 2,14). Também, ao final da sua missão na terra, suas palavras foram lição de paz. No alto de seus terríveis sofrimentos na cruz, reza: “Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem!” (Lc 23,24).
Os males atuais, como o relativismo, o individualismo e o materialismo podem comprometer a paz. Bento XVI afirmou: “Há uma ligação íntima entre a glorificação de Deus e a paz dos homens na terra... sem uma abertura ao transcendente, o homem cai como presa fácil do relativismo e, consequentemente, torna-se-lhe difícil agir de acordo com a justiça e comprometer-se pela paz” (Discurso ao Corpo Diplomático, jan. 2013).
Papa Francisco, na mensagem para o Dia Mundial da Paz do corrente ano de 2018, iniciou com os seguintes termos: “Paz a todas as pessoas da terra! A paz, que os anjos anunciaram aos pastores na Noite de Natal, é uma aspiração profunda de todas as pessoas e de todos os povos, sobretudo de quantos padecem mais duramente pela sua falta” (Mensagem 01 01 2018).
A reivindicação da justiça social é legítima, porém é necessário que seja feita nos princípios da paz, sem violência. Esta foi a característica da greve dos caminhoneiros acontecida há poucos dias. Se houve algum ato de violência não partiu dos mesmos, mas foi praticada por oportunistas que pretendem a desordem e, certamente, não creem na Palavra de Cristo.
Com Cristo Eucarístico, cuja festa nós cristãos celebramos há poucos dias, lutemos pela paz, pois ela interessa a todos.
Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora
Você pode dormir sossegado?
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- Segunda, 28 Maio 2018 12:30
A greve dos caminhoneiros representa um grito forte da população brasileira diante desta situação insuportável na governança do país. Esse mal não é problema só do governo atual, mas vem nos atormentando há décadas sob a égide da corrupção em todos os partidos. Há impostos demais e há roubalheira desavergonhada do dinheiro que pagamos à nação. Há políticos bons e bem-intencionados, mas que se veem impotentes diante do descalabro.
Tudo isso tira o sono dos brasileiros. Ninguém sabe que medidas seriam as mais acertadas para consertar este país. As opiniões divergem e, em certos casos, são conflitivas.
De minha parte, conclamo os fiéis a não se omitirem da responsabilidade de cidadãos conscientes e participativos através dos meios pacíficos e respeitosos; nunca apelem para lutas de classe, e nunca se deixem fanatizar por ideologias e nem por partidos. Nesta hora grave, se ponham em oração cada vez mais intensa, suplicando à Trindade Santíssima luzes para que se encontre o caminho certo para a superação dos problemas. Que não haja violência nem ódio, nem fome e nem, muito menos, derramamento de sangue. A paz a todos interessa. As soluções bélicas não servem a não ser para destruir e arruinar as famílias.
Mas desejo recordar também de um problema concreto que depende da decisão de cada um e não o consideremos menos importante. É a situação de pobreza, de miséria de muitos de nossos irmãos e que precisam de imediato socorro. A fome, a doença e o frio não podem esperar.
Por causa das graves questões do país, as obras assistenciais estão sem condições de atender a seus assistidos, por falta de alimentos e outros itens indispensáveis. Por exemplo, nosso Instituto Padre João Emilio, onde a Arquidiocese de Juiz de Fora assiste a 135 crianças e suas famílias, teve que fechar suas portas por, ao menos três dias, pois não há alimentos para fornecer. Outras obras tiveram que tomar a mesma decisão. O que cada um pode fazer?
Não há como dormir sabendo que alguém está sofrendo de fome, de dor e de tantos outros problemas e, por causa dos problemas políticos, nem mesmo as instituições que os ajudam podem funcionar.
O frio chegou. Como dormir sossegado, sabendo que há gente ameaçada de doenças e até de morte nas calçadas ou em casas precárias?
Faça uma visita ao seu guarda-roupa e veja quantas peças você não usa ou usa muito pouco e que lhe seriam dispensáveis. Quantos sapatos, sandálias, chinelos, meias, blusas, agasalhos, cobertores que você poderia oferecer para os mais pobres! Há quem diga, e eu concordo, que, se você passou um ano sem usar uma peça de seu vestuário, é porque não precisa dela. Aquela peça não lhe pertence mais. Tenha consciência disso.
Você não pode dormir às soltas, se você não doar ao menos o que lhe sobra, pois alguém está sem dormir justamente porque lhe falta o necessário.
Faça uma visita à sua despensa e à sua geladeira. Talvez aí também haja coisas com que você possa saciar a fome de uma criancinha. Às vezes vejo geladeiras ajuntando tantas sobrinhas que ninguém vai comer a acabarão no lixo. Tenha o costume de dar para os pobres o que você não precisa ajuntar.
Não podemos dormir em paz se alguém está com fome, com sede, necessitado de algo.
Nem quero falar de sua conta bancária! Você saberá se ela também não lhe tira o sono perante a miséria alheia, por exemplo, de gente que no Haiti come terra, ou de pessoas que aqui comem do que tiram no lixo.
Para terminar, quero propor-lhe uma reflexão tirada da Bíblia. É da carta de São Tiago. Diz assim: “E agora, vós, os ricos, chorai e gemei por causa das desgraças que estão para cair sobre vós. Vossa riqueza está apodrecendo e vossas roupas estão carcomidas pelas traças. Vosso ouro e vossa prata estão enferrujadas e a ferrugem deles vai depor contra vós e devorará vossas carnes, como fogo!“ (Tg 5, 1-3).
Podemos dormir sossegados?
Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora
Quem é o Espírito Santo?
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- Segunda, 21 Maio 2018 10:09
Após 50 dias, a contar da ressurreição de Jesus, os Apóstolos, reunidos num mesmo lugar, vivenciaram uma experiência nova. Vindo sobre eles como que línguas de fogo, após terem sentido no cenáculo um ruído como o de um vento impetuoso, desapareceram-lhes o medo, o desânimo e a dúvida (Cf. Atos 2, 1-11). De fato, o Senhor Jesus, antes de subir aos céus, lhes havia prevenido: “Tenho ainda muitas coisas a vos dizer, mas não sois capazes de compreendê-las agora. Quando ele vier, o Espírito da Verdade, vos guiará em toda a verdade” (Jo 16, 12-13).
Após aquele Pentecostes, os discípulos saíram da sala da ceia com a certeza inabalável de algumas verdades até então meio obscuras para eles. Não tiveram mais dúvidas de que Cristo era o Messias esperado, compreenderam que Jesus humano era também de natureza divina, e creram, de forma indubitável, que ele havia ressuscitado dos mortos. São Cirilo de Jerusalém (séc. IV) se expressou sobre esta clarividência da seguinte forma: “Quem se encontra nas trevas, ao nascer do sol recebe nos olhos a sua luz, começando a enxergar claramente coisas que até então não via”.
Destas certezas, passaram a ter comportamento diferenciado do período anterior. De medrosos que eram, a ponto de Pedro, primeiro dos Apóstolos, negar seu Mestre diante de uma servente do templo, passaram a atitudes destemidas diante de juízes, magistrados, governadores e outros chefes do povo. Nada mais lhes metia medo e nem lhes impedia de pregar em nome de Cristo, nem a dor, nem a espada, nem tribulação, nem angústia, nem perigo, nem fome (Cf. Rom 8, 35-36).
Como o fogo que se distribui em infinitas chamas sem nada perder de seu calor e de sua luz, nem diminuir de sua inteireza e intensidade original, assim o Espírito Santo os invadiu por inteiro, dando a cada um acolhê-lo conforme a sua necessidade pessoal, como expressou São Basílio Magno: “O Espírito Santo está presente em cada um dos que são capazes de recebê-lo, como se estivesse nele só, e, não obstante, dá a todos a totalidade da graça de que necessitam”.
São Paulo escreve aos Coríntios: “Ignorais, por acaso, que vosso corpo é templo do Espírito Santo, que mora em vós, e que vos é dado por Deus? E, portanto, ignorais também que vós não vos pertenceis a vós mesmos?” (I Cor 6, 19).
Como o vento que não se vê, mas que é constituído de força e de aragem, o Espírito Santo espalha suas sementes por todos os lugares e dá ao fiel a tranquilidade de alma para permanecer no amor e na paz, mesmo quando sopram os ventos da perseguição e do martírio.
O Espírito Santo produz, renova e reforça a unidade dos que creem e se juntam como irmãos. Faz cumprir o desejo expresso na longa oração de Cristo, antes de se entregar aos soldados de Pilatos, quando orou: “Que todos sejam um, como Tu, Pai, estás em mim e eu em Ti” (Jo 17, 21).
Como ensina o Concilio Vaticano II (1962-65), o “Espírito habita na Igreja e nos corações dos fiéis como em um templo. Neles ora e dá testemunho da adoção de filhos. Conduz a Igreja ao conhecimento da verdade total, unifica-a na comunhão e nos ministérios, ilumina-a com diversos dons carismáticos e hierárquicos e enriquece-a com seus frutos” (Lumen Gentium, 4.12).
No Cenáculo de Pentecostes, encontrava-se, entre os Apóstolos, segundo a narrativa de Lucas no Atos dos Apóstolos (Cf. Atos 1, 14), Maria, a mãe do Senhor que também foi novamente inebriada com a força do alto, como acontecera no dia em que o Arcanjo Gabriel lhe anunciou que seria a Mãe do Salvador. Lá foi concebido o Filho de Deus em seu seio virginal, aqui é gerada a Igreja, Corpo Místico de Cristo. Por este motivo, a Igreja invoca Maria, com o título de Mãe da Igreja, cuja festa litúrgica, por iniciativa do Papa Francisco, será celebrada, pela primeira vez, na Segunda-Feira após o Domingo de Pentecostes.
O Espírito Santo é a alma da Igreja, a força e a luz de cada fiel.
Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora
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