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O Cristão Cidadão

01092020-VIVA-A-PATRIA-DIVINA-NO-SEU-BRASIL-1A Semana da Pátria é uma oportunidade para compreender melhor a finalidade de uma nação, como também para avaliar se ela está alcançando seus objetivos. O Brasil é uma nação plural onde convivem muitas visões diferentes sobre todos os assuntos, como também propostas de como organizá-lo e governá-lo. Neste contexto, a Doutrina Social da Igreja orienta os fiéis católicos. Estas orientações, em grande parte, estão sintetizadas no capítulo oitavo denominado de “A comunidade política”, do “Compêndio da Doutrina Social da Igreja” e que são válidas para todo o mundo. Os ensinamentos situam-se na linha de princípios norteadores. Com a pretensão de ser o mais fiel possível transcrevo alguns ensinamentos que cabem neste espaço.

A Doutrina Social da Igreja sempre parte de aspectos bíblicos, tanto do Antigo quanto do Novo Testamento. Jesus perguntado sobre a legitimidade de pagar imposto responde: “O que é de César, devolvei a César, e o que é de Deus, a Deus”. Jesus “condena implicitamente toda tentativa de divinizar o poder temporal: somente Deus pode exigir tudo do homem. Ao mesmo tempo, o poder temporal tem o direito àquilo que lhe é devido: Jesus não considera injusto o tributo a César”. As mesmas orientações são dadas para as primeiras comunidades cristãs pelos apóstolos Paulo e Pedro que chamam os cristãos para os deveres cívicos, à obediência às autoridades legitimamente constituídas e a oração por elas.

“A mensagem bíblica inspira incessantemente o pensamento cristão sobre o poder político, recordando que ele tem sua origem em Deus, e como tal, é parte integrante da ordem criada. Tal ordem é percebida pelas consciências e se realiza na vida social mediante a verdade, a justiça e a solidariedade, que conduzem à paz”.

O segundo item trata do fundamento e da finalidade da comunidade política. “A pessoa humana é fundamento e fim da convivência política”. “A comunidade política, realidade conatural aos homens, existe para obter um fim comum, inatingível de outra forma: o crescimento em plenitude de cada um de seus membros, chamados a colaborar de modo estável para a realização do bem comum, sob o impulso da sua tensão natural para a verdade e para o bem”.

A comunidade política tem sua referência em formar um povo. “O povo não é uma multidão amorfa, uma massa inerte a ser manipulada e instrumentalizada, mas sim um conjunto de pessoas, cada uma das quais – no próprio lugar e a seu modo – tem a possibilidade de formar a própria opinião a respeito da coisa pública e a liberdade de exprimir a sua sensibilidade política e de fazê-la valer em maneira consoante com o bem comum”. “O que, em primeiro lugar, caracteriza um povo é a partilha de vida e de valores, que é fonte de comunhão no âmbito espiritual e moral”.

“A comunidade política persegue o bem comum atuando com vista à criação de um ambiente humano em que aos cidadãos seja oferecida a possibilidade de um real exercício dos direitos humanos e de um pleno cumprimento dos respectivos deveres”. Portanto, o cidadão é portador de direitos e de deveres. “A plena realização do bem comum requer que a comunidade política desenvolva, no âmbito dos direitos humanos, uma ação dúplice e complementar, de defesa e de promoção: ‘Evite-se que, através de preferências outorgadas a indivíduos ou grupos, se criem situações de privilégio”.

Jesus deixou claro aos seus seguidores que não deveriam se afastar do mundo, mas serem nele uma presença ativa como o sal e a luz, promovendo uma convivência baseada na “amizade civil” e na fraternidade.


Dom Rodolfo Luís Weber
Arcebispo de Passo Fundo

Seduziste-me, Senhor

catequista-catequeseNo último domingo do mês vocacional celebramos o dia nacional do Catequista. Não há como falar de vocação e missão na Igreja sem falarmos dessas pessoas que são tão importantes para o crescimento na fé de nossas comunidades e de nossa vida cristã. Neste domingo, queremos registrar o nosso enorme agradecimento a todos esses nossos irmãos e irmãs na fé que abraçaram a missão de nos levar a conhecer e aprofundar a nossa vida de fé, ajudando a tantas pessoas a acolher a mensagem da Revelação Cristã e a vivenciar a vida cristã. Vale a pena recordar a publicação do Novo Diretório Geral da Catequese, este grande instrumento que vai auxiliar nossa caminhada de Evangelização, sempre levando em conta que novos tempos mudam com muita rapidez diante de nós, exigindo estar sempre atualizados.

Hoje é também uma ocasião propícia para que nos recordemos dos nossos catequistas, seja nossos pais, nossos primeiros catequistas, nossos catequistas para a primeira comunhão e crisma ou os catequistas que nos prepararam para a recepção dos demais sacramentos. Façamos um exercício de memória e procuremos recordar de seus nomes e rezemos por eles. A catequese, em sua relação com a evangelização, tem a grande tarefa de nos incentivar a conhecer a fé e a fazer com que a fé se traduza na vida.

Não podemos deixar de mencionar a criatividade que atualmente tem sido utilizada por tantos catequistas nestes tempos diferentes de pandemia, utilizando de diversos meios para que a mensagem do Evangelho continue a chegar aos corações dos catequizandos. Demos graças a Deus por estes nossos irmãos e rezemos de forma especial por eles neste domingo.

A Palavra de Deus dirigida a nós neste 22º Domingo do Tempo Comum nos revela a pessoa de Jesus que veio para dar a Vida! No Evangelho (Mt 16,21-27) vemos duas partes bem marcadas: a primeira, Jesus que faz o anúncio de sua Paixão ao se dirigir a Jerusalém, recebendo o protesto de Pedro ante a verdade comunicada. Pedro é logo repreendido por Jesus ao protestar com Jesus pelo motivo de sua ida a Jerusalém. Na segunda parte, Jesus que apresenta claramente o caminho da cruz para todo aquele que o quiser seguir.

Muitas expectativas colocadas sobre Jesus eram as de que ele seria um libertador político, um rei descido dos céus que viria para libertar Jerusalém do jugo dos romanos. Em suas palavras e em seus gestos, Jesus mostra que é muito mais do que um libertador político: sua missão está em levar os homens a ter um coração e uma vida nova, vivendo a bondade e a pureza de coração. Jesus não veio somente para aquela situação política concreta. A missão de Jesus é muito mais ampla do que aquela mera dimensão histórica concreta. Jesus mostra a verdadeira libertação que precisa acontecer, a libertação da vida e do coração do homem. Com homens e mulheres novos é que o mundo poderá mudar mesmo.

A segunda parte do Evangelho vem exatamente motivada pelo espanto de Pedro ante a manifestação da real missão de Jesus. Jesus mostra que o mundo será transformado pela entrega e que o cristão há de transformar a sua realidade concreta através da entrega de sua vida, seguindo uma lógica bem diferente da que é propagada, pois quanto mais se dá a vida, mais se tem a vida.

O Evangelho fala de duas lógicas sem acordo: não se pode abraçar a sede louca do mundo de se dar bem a qualquer custo, de possuir tudo, de viver sempre no sucesso e no acordo com todos e, ao mesmo tempo, ser fiel ao Evangelho que vai numa outra direção. Vale para nós – valerá sempre – o desafio de Jesus: “Que adianta ao homem ganhar o mundo inteiro, mas perder a sua vida? O que poderá alguém dar em troca de sua vida?” Queridos irmãos e irmãs, olhemos o Cristo, pensemos no seu caminho e escutemos a palavra do Senhor a nós, seus discípulos: “Se alguém quer me seguir, renuncie a si mesmo, tome a sua cruz e me siga. Pois quem quiser salvar a sua vida vai perdê-la; e quem perder a sua vida por causa de mim, vai encontrá-la!”

É exatamente neste sentido, na vivência de uma nova lógica que traz a verdadeira vida, que a segunda leitura (Rm 12, 1-2) vai nos convidar a não nos conformarmos com esse mundo, mas olharmos para Ele e para a missão de uma forma nova. Se fizermos o bem e pregamos o amor, estamos no caminho, mas, se porventura fraquejamos, tenhamos força no Senhor para fazer à vontade d’Ele. É necessário sempre para cada um de nós a humildade e a força de sempre fazer a vontade de Deus.

Essa coragem de viver a nova lógica proposta pelo Evangelho é o que Jeremias nos relata na primeira Leitura (Jr 20,7-9), onde o profeta fala que foi seduzido pelas maravilhas do Amor de Deus, e mesmo tendo de fazer a experiência da maldade dos homens, mesmo se cansando, a ação do Espírito o anima a seguir adiante. A experiência da maldade no mundo nos desgasta e nos faz pensar em desistir. Deixemos que a Graça do Senhor nos sustente.

Chegando ao final do mês vocacional, especialmente neste domingo, demos graças a Deus por todos os nossos irmãos catequistas, pedindo ao Senhor de guardar a cada um deles e sustentá-los me sua missão. Não deixemos de rezar por todas as vocações, pois esta deve ser tarefa constante da vida da Igreja. Durante esta semana, rezemos em especial pelo nosso seminário, que no próximo sábado completa 281 anos de fundação. Rezemos também pelos nossos seminaristas que serão ordenados diáconos também no próximo sábado. Preparemos nossos corações para a vivência do mês de Bíblia, que será vivenciado em setembro, onde teremos a oportunidade de refletir e aprofundar a presença da Palavra de Deus na vida e na ação da Igreja.


Cardeal Orani João Tempesta
Arcebispo do Rio de Janeiro

Os chinelos do Cura d’Ars

Santo-CuraComo foi bela aquela viagem! Comigo foram quatro colegas, quando estudávamos em Roma. O calendário primaveril da Europa, marcava o dia 5 de abril de 1991. Eram os primeiros dias de Páscoa, quando as faculdades romanas oferecem férias festivas de uma semana. De Paris, tomamos um trem muito veloz que nos levou a Lion, depois Besançon e por fim, Ars, pequeno povoado cujo nome oficial é Ars sur Formans, comuna da França, do Distrito de Ain. Estávamos muito desejosos de visitar a pequenina paróquia onde viveu e se santificou Padre João Batista Maria Vianney, que se tornou conhecido em todo o mundo como o Santo Cura d’Ars.

Ao visitar sua casa paroquial, singela e pobre, adentramos seu quarto. Chamou-me logo à atenção o seu par de chinelos, debaixo da cama, ali conservado desde seu falecimento, em 4 de agosto de 1859. Como o chapéu toma a feição do dono, segundo o adágio popular, aqueles chinelos, feitos de tapete, revelavam os pés missionários do sacerdote. Lê-se em sua história que teve que atender a várias comunidades na região e, na maioria das vezes, ia a pé, quando muito, de carroça, levando sua volumosa valise com os objetos litúrgicos para a missa. De súbito, me veio à mente e ao coração as palavras do Profeta Isaías: “Quão formosos, sobre os montes, os pés dos que anunciam as boas novas; que trazem boas notícias, que proclamam a salvação; que dizem a Sião: o teu Deus reina! ” (Is 52,7). São Paulo, mais tarde, em sua carta aos Romanos, vai citar esta frase aplicando aos que pregam o Santo Evangelho de Cristo (cf. Rom 10,15).

Nascido aos 8 de maio de 1796, em plena revolução napoleônica, com tantos sofrimentos para a Igreja, o menino João Vianney desejou, desde muito cedo, ser padre. Família muito pobre, mas rica de fé e amor a Deus, somente aprendeu a ler e a escrever aos 18 anos. Estudando entre os feixes de feno, para não ser surpreendido pelas autoridades anticlericais, mal aprendeu o latim e não foi aluno brilhante em nenhuma matéria. Os seus reflexos luminosos estavam na alma, na sinceridade do caráter, na vida moral exemplar, sobretudo na vida intensa de oração. Apresentado por um padre, seu bom jeito de ser na juventude, sua assiduidade e gosto pelos ambientes religiosos, foram suficientes para convencer o bispo de ordená-lo, embora já se previsse para ele lugares humildes e nenhum destaque na organização pastoral. Ordenado, foi designado para a desprezível Ars, aonde nenhum padre desejaria ir. O lugar não contava mais que 300 habitantes, a vida do povo não ia além de bordéis, futilidades, bebidas alcoólicas e pouca religião.

Os pés do jovem sacerdote se puseram à estrada, enquanto a mente e o coração somente lhe inspiravam ardor nas coisas de Deus. Ia rezando e, confessou mais tarde: “a oração me traz alegria e nela nem vejo o tempo passar”.

Como Deus não precisa dos humanos, mas os humanos que precisam de Deus, aquele humilde servo se transformou numa inesperada e extraordinária atração para multidões sedentas de fé. De todas as partes da França e da Europa inteira, chegavam caravanas, não só de simples fiéis, mas também de padres, bispos e cardeais, para confessarem seus pecados, receberem a absolvição sagrada e se aconselharem para o prosseguimento da vida. Sua união com Deus era tão intensa, visível e natural, como dois pedaços de cera que, uma vez misturados, não mais se vê diferença e ninguém mais pode separar. Esta imagem foi usada por ele mesmo, quando pregava aos seus paroquianos sobre a oração. “Rezar e amar, eis o segredo da vida do cristão”, dizia ele.

Certa vez, foi a Ars um professor de Paris com o propósito de analisar, do ponto de vista sociológico, o fenômeno das multidões atraídas por um simples pároco rural. Voltou silencioso. Seus alunos lhe perguntaram: “o que viu em Ars?” Quebrando o segredo de sua transformação interior, lhes respondeu: “vi a Deus em um homem”.

Além de seus chinelos, chama à atenção do observador em Ars, o duro confessionário formado por banco de madeira e uma grade que se ergue à direita, onde o santo passava, às vezes, 18 horas em atendimento.

Ao lado da matriz paroquial, encontra-se ampla construção. É o orfanato que o Santo Cura d’Ars construiu com esmolas que povo lhe dava, para acolher crianças pobres. Chamou-o de “Casa da Providência”.

Com meus colegas de viagem, todos presbíteros, tivemos a graça de celebrar a missa diante de seu corpo conservado, recoberto de camada de cera. O bondoso sacristão, com gentil acolhida, nos trouxe o cálice sempre utilizado pelo Santo, para que, com ele, oferecêssemos o santo sacrifício de Cristo. Emocionante!

Ao retorno, nossos pés pareciam calçados de seus chinelos, ensinando-nos lições de humildade, simplicidade, oração e amor a Deus. Mistérios da santidade. Modelo para todo padre.


Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora

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