Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo
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- Terça, 17 Novembro 2020 12:30
Chegamos a mais um encerramento de um ano litúrgico chamado de Ano litúrgico A. No 34º Domingo do Tempo Comum, celebramos a Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo, Rei do Universo.
O Papa Pio XI (1922-1939), com a sua Encíclica Quas Primas (11 de novembro de 1925), estabeleceu a Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo Rei do Universo. Assim, este Santo Pontífice recordou a extensão do Senhorio de Jesus Cristo sobre todas as pessoas, famílias, cidades, povos e nações, governos e instituições, ou seja, a realeza social do Senhor Jesus sobre o mundo. A grande realidade da fé cristã é o Cristo Ressuscitado, vencedor do pecado e da morte, que concede a sua vitória aos que lhe pertencem. O Papa Pio Xi demonstrou com aquela Encíclica que o laicismo é a negação radical desta realeza de Cristo, pois organiza a vida social como se Deus não existisse. Tributar a Nosso Senhor Jesus Cristo os direitos de realeza não ferem a laicidade, uma vez que nenhum Estado está isento de suas obrigações para com Deus. Por isso esta Solenidade é muito importante num mundo, como o atual, que teima em não se curvar diante do Senhorio e da Realeza de Cristo!
Há uma grande verdade a respeito da vida que pode ser facilmente constatada por experiência: somos governados não apenas pelo que amamos, mas sobretudo, pelo que adoramos. Só reconhecemos como rei, só permitimos que nos governe, aquele, ou aquilo, que adoramos. E o problema é que podemos adorar muitos ídolos: dinheiro, sucesso, prazer – tudo, no fim das contas, que tem a ver com o nosso egocentrismo. E isso tem de ser descartado, tem de ser renunciado. Se colocarmos qualquer coisa que não seja Ele no trono do nosso coração, experimentaremos as consequências: prolongados – e cada vez mais frequentes – momentos de vazio, falta de sentido na vida, a impressão mais e mais nítida e perturbadora de que algo está faltando. Porque o nosso coração, e o coração de quem amamos, é sagrado. E é com base nessa verdade que devemos viver.
As leituras deste domingo falam-nos do Reino de Deus (esse Reino de que Jesus é rei). Apresentam-no como uma realidade que Jesus semeou, que os discípulos são chamados a edificar na história (através do amor) e que terá o seu tempo definitivo no mundo que há-de vir.
A primeira leitura(cf. Ez 34,11-12.15-17) utiliza a imagem do Bom Pastor para apresentar Deus e para definir a sua relação com os homens. A imagem sublinha, por um lado, a autoridade de Deus e o seu papel na condução do seu Povo pelos caminhos da história; e sublinha, por outro lado, a preocupação, o carinho, o cuidado, o amor de Deus pelo seu Povo.
O Evangelho(cf. Mt 25,31-46) apresenta-nos, num quadro dramático, o “rei” Jesus a interpelar os seus discípulo acerca do amor que partilharam com os irmãos, sobretudo com os pobres, os débeis, os desprotegidos. A questão é esta: o egoísmo, o fechamento em si próprio, a indiferença para com o irmão que sofre, não têm lugar no Reino de Deus. Quem insistir em conduzir a sua vida por esses critérios ficará à margem do Reino.
Na segunda leitura(cf. 1Cor 15,20-26.28), São Paulo lembra aos cristãos que o fim último da caminhada do crente é a participação nesse “Reino de Deus” de vida plena, para o qual Cristo nos conduz. Nesse Reino definitivo, Deus manifestar-Se-á em tudo e atuará como Senhor de todas as coisas (v. 28).
Neste dia, ao tributarmos a nossa adoração a Nosso Senhor Jesus Cristo Rei do Universo, porque o nosso coração, e o coração de quem amamos, é sagrado. E é com base nessa verdade que devemos viver. Não desrespeite seu coração e não deixe que ele seja desrespeitado. Ame a Jesus de todo o seu coração. Ame seu próximo como Ele ensinou. Carregue sua cruz unido a Ele. Seja discípulo dele e não dos ídolos deste mundo. E você será um súdito muito feliz, e capaz de comunicar essa alegria a todos com quem convive. Que Nosso Senhor Jesus Cristo seja Rei de nossas vidas, hoje e por todo o sempre, Amém!
Dom Eurico dos Santos Veloso
Arcebispo Emérito de Juiz de Fora (MG)
Mensagem do santo padre Francisco para o IV Dia Mundial dos Pobres
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- Segunda, 09 Novembro 2020 11:13
XXXIII Domingo do Tempo Comum
(15 de novembro de 2020)
«Estende a tua mão ao pobre» (Sir 7, 32)
«Estende a tua mão ao pobre» (Sir 7, 32): a sabedoria antiga dispôs estas palavras como um código sacro que se deve seguir na vida. Hoje ressoam com toda a densidade do seu significado para nos ajudar, também a nós, a concentrar o olhar no essencial e superar as barreiras da indiferença. A pobreza assume sempre rostos diferentes, que exigem atenção a cada condição particular: em cada uma destas, podemos encontrar o Senhor Jesus, que revelou estar presente nos seus irmãos mais frágeis (cf. Mt 25, 40).
1. Tomemos nas mãos o Ben-Sirá, um dos livros do Antigo Testamento. Nele encontramos as palavras dum mestre da sabedoria que viveu cerca de duzentos anos antes de Cristo. Andava à procura da sabedoria que torna os homens melhores e capazes de perscrutar profundamente as vicissitudes da vida. E fê-lo num período de dura prova para o povo de Israel, um tempo de dor, luto e miséria por causa da dominação de potências estrangeiras. Sendo um homem de grande fé, enraizado nas tradições dos pais, o seu primeiro pensamento foi dirigir-se a Deus para Lhe pedir o dom da sabedoria. E o Senhor não lhe deixou faltar a sua ajuda.
Desde as primeiras páginas do livro, Ben-Sirá propõe os seus conselhos sobre muitas situações concretas da vida, sendo a pobreza uma delas. Insiste que, na contrariedade, é preciso ter confiança em Deus: «Não te perturbes no tempo do infortúnio. Conserva-te unido a Ele e não te separes, para teres bom êxito no teu momento derradeiro. Aceita tudo o que te acontecer e tem paciência nas vicissitudes da tua humilhação, porque no fogo se prova o ouro, e os eleitos de Deus no cadinho da humilhação. Nas doenças e na pobreza, confia n’Ele. Confia em Deus e Ele te salvará, endireita os teus caminhos e espera n’Ele. Vós que temeis o Senhor, esperai na sua misericórdia, e não vos afasteis, para não cairdes» (2, 2-7).
2. Página a página, descobrimos um precioso compêndio de sugestões sobre o modo de agir à luz duma relação íntima com Deus, criador e amante da criação, justo e providente para com todos os seus filhos. Mas, a constante referência a Deus não impede de olhar para o homem concreto; pelo contrário, as duas realidades estão intimamente conexas.
Demonstra-o claramente o texto donde se tirou o título desta Mensagem (cf. 7, 29-36). São inseparáveis a oração a Deus e a solidariedade com os pobres e os enfermos. Para celebrar um culto agradável ao Senhor, é preciso reconhecer que toda a pessoa, mesmo a mais indigente e desprezada, traz gravada em si mesma a imagem de Deus. De tal consciência deriva o dom da bênção divina, atraída pela generosidade praticada para com os pobres. Por isso, o tempo que se deve dedicar à oração não pode tornar-se jamais um álibi para descuidar o próximo em dificuldade. É verdade o contrário: a bênção do Senhor desce sobre nós e a oração alcança o seu objetivo, quando são acompanhadas pelo serviço dos pobres.
3. Como permanece atual, também para nós, este ensinamento! Na realidade, a Palavra de Deus ultrapassa o espaço, o tempo, as religiões e as culturas. A generosidade que apoia o vulnerável, consola o aflito, mitiga os sofrimentos, devolve dignidade a quem dela está privado, é condição para uma vida plenamente humana. A opção de prestar atenção aos pobres, às suas muitas e variadas carências, não pode ser condicionada pelo tempo disponível ou por interesses privados, nem por projetos pastorais ou sociais desencarnados. Não se pode sufocar a força da graça de Deus pela tendência narcisista de se colocar sempre a si mesmo no primeiro lugar.
Manter o olhar voltado para o pobre é difícil, mas tão necessário para imprimir a justa direção à nossa vida pessoal e social. Não se trata de gastar muitas palavras, mas antes de comprometer concretamente a vida, impelidos pela caridade divina. Todos os anos, com o Dia Mundial dos Pobres, volto a esta realidade fundamental para a vida da Igreja, porque os pobres estão e sempre estarão connosco (cf. Jo 12, 8) para nos ajudar a acolher a companhia de Cristo na existência do dia a dia.
4. O encontro com uma pessoa em condições de pobreza não cessa de nos provocar e questionar. Como podemos contribuir para eliminar ou pelo menos aliviar a sua marginalização e o seu sofrimento? Como podemos ajudá-la na sua pobreza espiritual? A comunidade cristã é chamada a coenvolver-se nesta experiência de partilha, ciente de que não é lícito delegá-la a outros. E, para servir de apoio aos pobres, é fundamental viver pessoalmente a pobreza evangélica. Não podemos sentir-nos tranquilos, quando um membro da família humana é relegado para a retaguarda, reduzindo-se a uma sombra. O clamor silencioso de tantos pobres deve encontrar o povo de Deus na vanguarda, sempre e em toda parte, para lhes dar voz, defendê-los e solidarizar-se com eles face a tanta hipocrisia e tantas promessas não cumpridas, e para os convidar a participar na vida da comunidade.
É verdade que a Igreja não tem soluções globais a propor, mas oferece, com a graça de Cristo, o seu testemunho e gestos de partilha. Além disso, sente-se obrigada a apresentar os pedidos de quantos não têm o necessário para viver. Lembrar a todos o grande valor do bem comum é, para o povo cristão, um compromisso vital, que se concretiza na tentativa de não esquecer nenhum daqueles cuja humanidade é violada nas suas necessidades fundamentais.
5. Estender a mão leva a descobrir, antes de tudo a quem o faz, que dentro de nós existe a capacidade de realizar gestos que dão sentido à vida. Quantas mãos estendidas se veem todos os dias! Infelizmente, sucede sempre com maior frequência que a pressa faz cair num turbilhão de indiferença, a tal ponto que se deixa de reconhecer todo o bem que se realiza diariamente no silêncio e com grande generosidade. Assim, só quando acontecem factos que transtornam o curso da nossa vida é que os olhos se tornam capazes de vislumbrar a bondade dos santos «ao pé da porta», «daqueles que vivem perto de nós e são um reflexo da presença de Deus» (Francisco, Exort. ap. Gaudete et exsultate, 7), mas dos quais ninguém fala. As más notícias abundam de tal modo nas páginas dos jornais, nos sites da internet e nos visores da televisão, que faz pensar que o mal reine soberano. Mas não é assim. Certamente não faltam a malvadez e a violência, a prepotência e a corrupção, mas a vida está tecida por atos de respeito e generosidade que não só compensam o mal, mas impelem a ultrapassá-lo permanecendo cheios de esperança.
6. Estender a mão é um sinal: um sinal que apela imediatamente à proximidade, à solidariedade, ao amor. Nestes meses, em que o mundo inteiro foi dominado por um vírus que trouxe dor e morte, desconforto e perplexidade, pudemos ver tantas mãos estendidas! A mão estendida do médico que se preocupa de cada paciente, procurando encontrar o remédio certo. A mão estendida da enfermeira e do enfermeiro que permanece, muito para além dos seus horários de trabalho, a cuidar dos doentes. A mão estendida de quem trabalha na administração e providencia os meios para salvar o maior número possível de vidas. A mão estendida do farmacêutico exposto a inúmeros pedidos num arriscado contacto com as pessoas. A mão estendida do sacerdote que, com o coração partido, continua a abençoar. A mão estendida do voluntário que socorre quem mora na rua e a quantos, embora possuindo um teto, não têm nada para comer. A mão estendida de homens e mulheres que trabalham para prestar serviços essenciais e segurança. E poderíamos enumerar ainda outras mãos estendidas, até compor uma ladainha de obras de bem. Todas estas mãos desafiaram o contágio e o medo, a fim de dar apoio e consolação.
7. Esta pandemia chegou de improviso e apanhou-nos impreparados, deixando uma grande sensação de desorientamento e impotência. Mas, a mão estendida ao pobre não chegou de improviso. Antes, dá testemunho de como nos preparamos para reconhecer o pobre a fim de o apoiar no tempo da necessidade. Não nos improvisamos instrumentos de misericórdia. Requer-se um treino diário, que parte da consciência de quanto nós próprios, em primeiro lugar, precisamos duma mão estendida em nosso favor.
Este período que estamos a viver colocou em crise muitas certezas. Sentimo-nos mais pobres e mais vulneráveis, porque experimentamos a sensação da limitação e a restrição da liberdade. A perda do emprego, dos afetos mais queridos, como a falta das relações interpessoais habituais, abriu subitamente horizontes que já não estávamos acostumados a observar. As nossas riquezas espirituais e materiais foram postas em questão e descobrimo-nos amedrontados. Fechados no silêncio das nossas casas, descobrimos como é importante a simplicidade e o manter os olhos fixos no essencial. Amadureceu em nós a exigência duma nova fraternidade, capaz de ajuda recíproca e estima mútua. Este é um tempo favorável para «voltar a sentir que precisamos uns dos outros, que temos uma responsabilidade para com os outros e o mundo (...). Vivemos já muito tempo na degradação moral, baldando-nos à ética, à bondade, à fé, à honestidade (...). Uma tal destruição de todo o fundamento da vida social acaba por colocar-nos uns contra os outros na defesa dos próprios interesses, provoca o despertar de novas formas de violência e crueldade e impede o desenvolvimento duma verdadeira cultura do cuidado do meio ambiente» (Francisco, Carta enc. Laudato si’, 229). Enfim, as graves crises económicas, financeiras e políticas não cessarão enquanto permitirmos que permaneça em letargo a responsabilidade que cada um deve sentir para com o próximo e toda a pessoa.
8. «Estende a mão ao pobre» é, pois, um convite à responsabilidade, sob forma de empenho direto, de quem se sente parte do mesmo destino. É um encorajamento a assumir os pesos dos mais vulneráveis, como recorda São Paulo: «Pelo amor, fazei-vos servos uns dos outros. É que toda a Lei se cumpre plenamente nesta única palavra: ama o teu próximo como a ti mesmo. (...) Carregai as cargas uns dos outros» (Gal 5, 13-14; 6, 2). O Apóstolo ensina que a liberdade que nos foi dada com a morte e ressurreição de Jesus Cristo é, para cada um de nós, uma responsabilidade para colocar-se ao serviço dos outros, sobretudo dos mais frágeis. Não se trata duma exortação facultativa, mas duma condição da autenticidade da fé que professamos.
E aqui volta o livro de Ben-Sirá em nossa ajuda: sugere ações concretas para apoiar os mais vulneráveis e usa também algumas imagens sugestivas. Primeiro, toma em consideração a debilidade de quantos estão tristes: «Não fujas dos que choram» (7, 34). O período da pandemia constrangeu-nos a um isolamento forçado, impedindo-nos até de poder consolar e estar junto de amigos e conhecidos atribulados com a perda dos seus entes queridos. E, depois, afirma o autor sagrado: «Não sejas preguiçoso em visitar um doente» (7, 35). Experimentamos a impossibilidade de estar junto de quem sofre e, ao mesmo tempo, tomamos consciência da fragilidade da nossa existência. Enfim, a Palavra de Deus nunca nos deixa tranquilos e continua a estimular-nos para o bem.
9. «Estende a mão ao pobre» faz ressaltar, por contraste, a atitude de quantos conservam as mãos nos bolsos e não se deixam comover pela pobreza, da qual frequentemente são cúmplices também eles. A indiferença e o cinismo são o seu alimento diário. Que diferença relativamente às mãos generosas que acima descrevemos! Com efeito, existem mãos estendidas para premer rapidamente o teclado dum computador e deslocar somas de dinheiro duma parte do mundo para outra, decretando a riqueza de restritas oligarquias e a miséria de multidões ou a falência de nações inteiras. Há mãos estendidas a acumular dinheiro com a venda de armas que outras mãos, incluindo mãos de crianças, utilizarão para semear morte e pobreza. Existem mãos estendidas que, na sombra, trocam doses de morte para se enriquecer e viver no luxo e num efémero desregramento. Existem mãos estendidas que às escondidas trocam favores ilegais para um lucro fácil e corruto. E há também mãos estendidas que, numa hipócrita respeitabilidade, estabelecem leis que eles mesmos não observam.
Neste cenário, «os excluídos continuam a esperar. Para se poder apoiar um estilo de vida que exclui os outros ou mesmo entusiasmar-se com este ideal egoísta, desenvolveu-se uma globalização da indiferença. Quase sem nos dar conta, tornamo-nos incapazes de nos compadecer ao ouvir os clamores alheios, já não choramos à vista do drama dos outros, nem nos interessamos por cuidar deles, como se tudo fosse uma responsabilidade de outrem, que não nos incumbe» (Francisco, Exort. ap Evangelii gaudium, 54). Não poderemos ser felizes enquanto estas mãos que semeiam morte não forem transformadas em instrumentos de justiça e paz para o mundo inteiro.
10. «Em todas as tuas obras, lembra-te do teu fim» (Sir 7, 36): tal é a frase com que Ben-Sirá conclui a sua reflexão. O texto presta-se a uma dupla interpretação. A primeira destaca que precisamos de ter sempre presente o fim da nossa existência. A lembrança do nosso destino comum pode ajudar a conduzir uma vida sob o signo da atenção a quem é mais pobre e não teve as mesmas possibilidades que nós. Mas existe também uma segunda interpretação, que evidencia principalmente a finalidade, o objetivo para o qual tende cada um. É a finalidade da nossa vida que exige um projeto a realizar e um caminho a percorrer sem se cansar. Pois bem! O objetivo de cada ação nossa só pode ser o amor: tal é o objetivo para onde caminhamos, e nada deve distrair-nos dele. Este amor é partilha, dedicação e serviço, mas começa pela descoberta de que primeiro fomos nós amados e despertados para o amor. Esta finalidade aparece no momento em que a criança se cruza com o sorriso da mãe, sentindo-se amada pelo próprio facto de existir. De igual modo um sorriso que partilhamos com o pobre é fonte de amor e permite viver na alegria. Possa então a mão estendida enriquecer-se sempre com o sorriso de quem não faz pesar a sua presença nem a ajuda que presta, mas alegra-se apenas em viver o estilo dos discípulos de Cristo.
Neste caminho de encontro diário com os pobres, acompanha-nos a Mãe de Deus que é, mais do que qualquer outra, a Mãe dos pobres. A Virgem Maria conhece de perto as dificuldades e os sofrimentos de quantos estão marginalizados, porque Ela mesma Se viu a dar à luz o Filho de Deus num estábulo. Devido à ameaça de Herodes, fugiu, juntamente com José, seu esposo, e o Menino Jesus, para outro país e, durante alguns anos, a Sagrada Família conheceu a condição de refugiados. Possa a oração à Mãe dos pobres acomunar estes seus filhos prediletos e quantos os servem em nome de Cristo. E a oração transforme a mão estendida num abraço de partilha e reconhecida fraternidade.
Roma, em São João de Latrão, na Memória litúrgica de Santo Antônio, 13 de junho de 2020.
Francisco
Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a ti mesmo
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- Quarta, 28 Outubro 2020 09:54
O Mês Missionário neste ano de 2020, com seu lema “Eis-me aqui, envia-me” (Is 6,8), encerrou-se com a mensagem central da pregação de Jesus: a lei suprema do amor.
Procurado pelos fariseus que quiseram pô-Lo à prova, Lhe fizeram uma pergunta: Qual é o maior dos mandamentos? (Mt 22, 36). Para representar o grupo, escolheram um Doutor da Lei, portanto um perito em Sagrada Escritura para propor a questão, pronto para surpreender o jovem Jesus em algum deslize. Mas, quem ficará surpreendido é mesmo o perito e todo o grupo dos intrigantes eternos de Cristo, os fariseus.
Ele responde com estas palavras: Amarás o Senhor teu Deus de todo o coração, de toda a alma e de todo o teu entendimento. Este é maior e o primeiro mandamento. O Segundo é semelhante a esse: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Toda a Lei e os profetas dependem destes dois mandamentos (Mt 22, 37-30).
Os judeus tinham muitos mandamentos. Um estudioso da Sagrada Escritura individualizou 613 mandamentos no Antigo Testamento, sendo 365 proibições e 248 preceitos positivos. Neste emaranhado de leis, certamente haveria divergências em interpretar quais seriam os mais importantes. Porém, o amor a Deus em primeiro lugar era indubitável. Ele constitui a Shemá, o versículo que todo judeu repetia, todos os dias, de manhã e de tarde: Escuta Israel: o Senhor é teu Deus… Jesus estava citando Deuteronômio 5, 6, mas ajuntando outro mandamento escrito no livro do Levítico, 19,18: Amarás o teu próximo…, demonstrando que, na realidade, não pode haver um privilégio de um em prejuízo do outro.
É assim o amor que Deus criou. Ele nos criou para amar e ser amados. Criou-nos à Sua semelhança, pois o Pai também existe para amar e ser amado. O ser humano definido na escolástica medieval, baseado na filosofia aristotélica, como apenas um ‘animal racional’, na idade atual, inclusive na antropologia do Concílio Vaticano II, recebe uma definição mais ampla e mais calorosa: ele é um ser eminentemente relacional. Existe para amar e ser amado.
Daí podemos tirar a primeira conclusão: o mundo precisa se organizar sobre as bases da lei do amor. Hoje podemos verificar dois grandes grupos: o verticalismo de alguns e o horizontalismo de outros. Segundo o mandamento de Jesus, é impossível essa dicotomia, causando ela prejuízos antropológicos irreparáveis. Para Cristo, é impossível amar a Deus sem amar ao próximo, e nem é verdadeiro amor a atenção ao próximo sem o amor a Deus. Por isso São João vai dizer: quem diz que ama a Deus e não ama seu irmão é um mentiroso (I Jo 4, 20-21).
Na construção de um mundo novo, os cristãos, sobretudo, defenderão estes dois importantes elementos inseparáveis. Construir uma sociedade justa sem Deus é impossível. Fixar-se no verticalismo, pretendo amá-Lo sem amar concretamente ao próximo, resultará num amor defeituoso, enganoso, uma vez que se distancia do próprio Criador. O caminho mais curto, mais certeiro, mais belo para amar a Deus passa pelo coração do irmão.
Mas o que é o amor ao próximo para Cristo? Há muitas respostas nos santos evangelhos, como a parábola do Bom Samaritano, os milagres em favor dos mais sofredores, o mandamento novo dado nas vésperas da sua morte, e a descrição do juízo final do capítulo 25 de São Mateus: tive fome e me destes de comer…
Eis aí o sentido exato da missão para qualquer missionário: o anúncio de Jesus Cristo, ícone do amor a Deus e ao próximo.
Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora
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