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Pedro hoje é Francisco

Francisco-e-os-apostolosCelebramos, no dia 4 de julho, a Solenidade de São Pedro e São Paulo, duas colunas fortes da Igreja desde seus primórdios. Celebramos o final de suas vidas, recordando o martírio que cada um padeceu. O dia litúrgico, 29 de junho, era celebrado pelo Império Romano como aniversário dos dois fundadores de Roma: Rômulo e Remo. Para os cristãos dos primeiros tempos, que transformavam festas pagãs em festas cristãs, dando a elas o sentido sublime da fé que professavam, Pedro e Paulo eram os anunciadores e, pelo desejo de Cristo, alicerces da cidade eterna. A festa já era celebrada no século III, antes mesmo de universalizar o dia do Natal do Senhor.

São duas personalidades completamente diferentes. Pedro era pescador, certamente pouco letrado, homem simples do povo. Paulo era mestre, estudado e acadêmico. Porém, de formas diferentes, ambos manifestavam quatro características importantes: 1) eram de espírito determinado e amavam intensa e ardorosamente a Cristo; 2) reconheceram suas fragilidades: Pedro chorava amargamente por ter negado três vezes o Senhor e Paulo, depois da conversão, reconheceu que fora perseguidor dos cristãos e se arrependeu disso. Confiaram na misericórdia de Deus e não desanimaram; 3) deram-se inteiramente ao apostolado, anunciando Cristo intrepidamente: Pedro para os judeus, Paulo para os gentios e pagãos; 4) ambos foram martirizados em Roma: Pedro foi crucificado de ponta cabeça e Paulo foi decapitado.

A leitura do evangelho da solenidade dos dois apóstolos apresenta Pedro como o primeiro a confessar a fé em Cristo como o Messias esperado. Tu és o Messias, o Filho de Deus vivo (Mt 16, 16). A resposta de Pedro agradou a Jesus, que lhe revela três coisas:

1) Feliz és tu, Simão, filho de Jonas, pois não foi nenhum ser humano que te revelou isso, mas meu Pai que está no céu (Mt 16, 17): a confissão de fé de Pedro não é algo apenas das qualidades humanas, mas algo previsto por Deus. Ele O ama particularmente e foi inspirado pelo Espírito Santo. A fundação da Igreja se dá por desejo único de Cristo que a quer una e fidelíssima à vontade do Pai. O poder que Pedro recebeu e repartiu com todos os apóstolos se perpetua no mistério da Igreja.

2) Tu és Pedro e sobre esta pedra eu edificarei a minha Igreja (Mt 16, 18): a pedra fundamental é Cristo, a pedra visível é Pedro. Não Pedro individualmente, mas todos os seus sucessores, pois tornam visível a Cristo no tempo presente. Aí está a legitimidade da expressão “Vigário de Cristo na Terra”. Age, em sua função, de certa forma, como a ação de todo sacerdote, in persona Christi. O Papa é a pedra visível de Cristo invisível, como expressa Santo Agostinho.

3) Eu te darei as chaves do Reino de Deus; tudo o que ligares na terra, será ligado no céu, tudo o que tu desligares na terra será desligado nos céus (Mt 16, 19): também as chaves não são de Pedro, mas de Cristo. Ele dá, mais uma vez a Pedro, algo que é seu. Só Cristo liga na Terra o que é ligado no céu, mas Ele deixa este poder na mão da Igreja através de Pedro, que é símbolo e construtor da unidade. O fato de conferir tanta credibilidade a uma só pessoa significa o desejo de Cristo pela unidade. Ele quer um só rebanho e um só Pastor (Jo 10, 14); um só batismo, um só Salvador; Ele quer que todos sejam um como Ele e o Pai (cf. Jo 17, 21); a comunidade dos primeiros cristãos era um só coração e uma só alma (cf. At 2, 4).

Pedro e Paulo, personalidades tão diferentes, celebrados em uma só festa. Ambos frágeis, ambos fortificados pela graça. Pedro, homem simples que falhou tantas vezes; Paulo, homem culto, falava várias línguas, capaz de dialogar com culturas diferentes, competente para discutir com argumentos sólidos.

Por que Cristo escolheu a Pedro, o menos acadêmico, o mais simples, para receber as chaves, para ser a pedra visível da base da Igreja, para ser o primeiro Papa? Certamente, por causa de sua autenticidade, sua capacidade de reiniciar sua vida de fé após as quedas, de perdoar, de perseverar com Cristo, mesmo quando experimentava a fragilidade. Venceu o medo, o desânimo; viveu com Cristo, para Cristo e em Cristo. Deu sua vida por Cristo e teve a graça de morrer com o mesmo suplício, a cruz.

Pedro hoje é Francisco, exemplo de simplicidade, alegria, preocupação com a fraternidade (Fratelli Tutti), com a natureza (Laudato Si), com a santidade (Patris Corde; Gaudete et exultate) e devoção a Maria (Mês de Maio, orações pelo fim da pandemia). Em união com o Papa, Sucessor de Pedro, e movidos pelo espírito de missionário intrépido de Paulo, prossigamos nossa fidelidade na Igreja fundada por Cristo, em busca da unidade perdida, agindo sem proselitismo, sem orgulho, sem vaidade, mas na humildade, sinceridade de viver nosso amor a Cristo, assentados firmes sobre a rocha que é o Pedro.


Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora

Em tempo de pandemia: Evangelização proativa

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"Não podemos esquecer que evangelizar não é algo inútil e sem esperança, nesse tempo de pandemia"

Nesse tempo de pandemia, somos chamados a rever nossa prática evangelizadora, sendo mais ousados, criativos, visionários e, principalmente, proativos na evangelização. Evangelizar no Brasil, “cada vez mais urbano, pelo anúncio da Palavra de Deus, formando discípulos e discípulas de Jesus Cristo, em comunidades eclesiais missionárias, à luz da evangélica opção preferencial pelos pobres, cuidando da casa comum e testemunhado o Reino de Deus rumo à plenitude” (Doc. CNBB 109, Objetivo Geral).

Na mitologia grega, Sísifo era considerado o mais astuto e ardiloso dos mortais. Muito inteligente e sem escrúpulos por saber trapacear os homens e até os deuses. Julgava-se invencível, até mesmo mais esperto que todos os deuses. Muito hábil na arte de mentir, parecendo que tudo o que falava era verdade. No entanto, por possuir tantas virtudes chegou a enganar os próprios deuses. Os deuses perderam a paciência com Sísifo e deram-lhe uma pena terrível por toda a eternidade. Condenaram Sísifo a carregar com as mãos uma rocha pesada até o cume de uma montanha. Lá, exausto, não tinha forças para impedir que ela rolasse ladeira abaixo, tinha que recomeçar a carregá-la todo os dias.

O trabalho de Sísifo era um trabalho árduo, repetitivo, despropositado e sem esperança de dar resultados. Os resultados eram sempre infrutíferos, irrelevantes e frustrantes. Uma situação interminável e inútil. Os deuses imaginaram que não haveria punição mais terrível que o trabalho inútil e sem esperança.

Muitas vezes, o cotidiano dos ministros ordenados e não ordenados gira em torno de uma rotina diária e repetitiva de atividades voltadas quase que, exclusivamente, para a sacramentalização. Temos todo conhecimento, sabedoria, técnicas, metodologias para os sacramentos. Somos os profissionais e especialistas dos sacramentos e esquecemos da evangelização. Somos ousados, visionários e sabemos manter esta prática sem um propósito concreto, na dinâmica da evangelização.

O dia a dia de Sísifo, empurrando a pedra até o alto da montanha, pode ser uma analogia perfeita para ministros ordenados e não ordenados, em tempo de pandemia, quando a participação nos sacramentos está limitada para muita gente. O documento de Aparecida fala em “manutenção pastoral”. A maioria das vezes consideramos o Mistério Pascal como algo funcional, sem a essência de sua riqueza. Frente à crise sanitária, com inúmeros protocolos, não estamos sabendo distinguir a necessidade do valor e da sublimidade do Mistério Pascal. Não podemos esquecer que evangelizar não é algo inútil e sem esperança, nesse tempo de pandemia.

No entanto, temos que encontrar novas metodologias, estratégias, técnicas para que a evangelização tenha sua razão de ser e o seu espaço. Portanto, em consequência, os fiéis procurem celebrar o Mistério Pascal, não só em cada sacramento, com maior ardor de fé. Devemos fazer do Mistério Pascal o esteio para o crescimento e vivência da fé encarnada na vida, na família, no trabalho e nas diversas situações de morte e vida que estamos vivendo. Focando na evangelização, nesse tempo fértil, estaremos preparando um construto para a vivência encarnada do Mistério Pascal. Finalmente, não seremos com Sísifo. Mas, aprendemos com ele que temos que ter foco em nossa missão, que é evangelizar, isto é, fazer com que as pessoas possam encontrar com Jesus, fazer a experiência do encontro com ele, no dia a dia, segui-lo em seu caminho e anunciar essa experiência aos outros, mediante o testemunho de vida.

A missão da Igreja é evangelizar nos alertou o papa São Paulo VI, na exortação apostólica Evangelii nuntiandi, em 1974, após o Sínodo sobre a evangelização. É isso que Jesus pediu aos apóstolos, quando os enviou a todos os povos e a toda criatura: “Ide, anunciai o Evangelho” e o que quer de nós nesse tempo de crise sanitária.


Dom Edson José Oriolo dos Santos

Bispo Diocesano de Leopoldina - MG

Jesus sempre nos dá a vida nova!

Deus-te-amaDeus ama a vida! Ele quer apenas a vida! “Deus criou o homem para ser incorruptível” (primeira leitura – Sb 1,13-15;2,23-24). Pelo seu Filho, salva-nos da morte: eis porque Lhe damos graças em cada Eucaristia. Na sua vida terrena, Jesus sempre defendeu a vida. Deus não tem prazer em destruir a vida, mas é sempre favorável a ela; a causa dos males é o diabo. Deus criou a pessoa para a imortalidade. A justiça é imortal, diz o autor, e ela torna o ser humano imortal. Deus não é indiferente ao sofrimento, pois quer ver o ser humano feliz e deseja tê-lo em sua eternidade. O nosso Deus é o Deus da vida. O Livro da Sabedoria professa essa verdade com palavras maravilhosas. Fomos criados para o amor e nele devemos permanecer, porque isso gera a vida ao nosso redor. Nós, que fomos criados à imagem e semelhança de Deus, carregamos em nós o dom da vida para que seja levada a todos os que caminham na escuridão.

O Evangelho deste 13º. Domingo do Tempo Comum(Mc 5,21-43) relata-nos dois episódios que assinalam a defesa da vida: Ele cura, Ele levanta. Ele torna livres todas as pessoas, dá-lhes toda a dignidade e capacidade para viver plenamente. Sabemos dizer-Lhe que Ele é a nossa alegria de viver? Estamos em tempo de festas juninas, tempo de início de férias escolares… É uma ocasião propícia para celebrar a festa da vida! O 13º domingo celebra a vida mais forte que a morte, celebra Deus apaixonado pela vida. Convém, pois, que na celebração deste dia a vida exploda em todas as suas formas: na beleza das flores, nos gestos e atitudes, na proclamação da Palavra, nos cânticos e aclamações, na luz. No cântico do salmo e na profissão de fé, será bom recordar que é o Deus da vida que nós confessamos, as suas maravilhas que nós proclamamos. Durante toda a missa, rezando, mantenhamos a convicção expressa pelo Livro da Sabedoria: “Deus não Se alegra com a perdição dos vivos”. O Evangelho apresenta um relato com duplo milagre: duas mulheres necessitadas recebem a cura do Mestre de Nazaré. As personagens são movidas por grande fé: Jairo acredita que a imposição das mãos de Jesus curará sua filha; a mulher com hemorragia acredita que basta tocar na roupa do Mestre para ficar curada. A bondade do Pai revelada no Filho liberta do sofrimento e da morte.

Essas duas curaras maravilhosas do Evangelho: uma no caminho e outra em casa; uma mulher que sofre há doze anos e uma menina que morre na idade de doze anos. No lugar em que Jesus está, é a vida que floresce e a morte não pode dominar as pessoas. No lugar em que Jesus passa, floresce a vida, tal qual primavera eterna que enche os corações de esperança e de alegria. A mulher toca as vestes de Jesus e Ele toma a mão da menina. Em suas palavras, a vida; em seu toque, o calor da Ressurreição.

São Paulo (2Cor 8,7.9.13-15) faz um apelo à comunidade de Corinto para que seja generosa com os pobres da comunidade de Jerusalém. Para o autor, a comunidade deve ter a consciência de que constitui um “corpo único” com as outras comunidades e, portanto, a solidariedade entre eles é fundamental.

Jesus sempre vence a morte! Jesus é aquele que restitui a vida em plenitude. Ele é o homem das periferias geográficas e existenciais que se compadece da humanidade ferida. Por isso se move sempre de uma margem a outra, para atender a todos os que o buscam. Embora caminhe cercada por uma multidão, ele se interessa pelas pessoas em suas particularidades. Nestes tempos difíceis da pandemia da COVID-19 imitemos os gestos de Jesus e sejamos transmissores de vida e vida plena que só Cristo pode nos dar!

 

Dom Eurico dos Santos Veloso
Arcebispo Emérito de Juiz de Fora (MG)

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