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O Amor é mais forte que a morte

maria madalenaLogo de manhã Maria Madalena correu até o túmulo e foi verificar a situação de Jesus (Jo 20,1). Aquele mesmo, que pouco antes tinha sido crucificado.

A morte, como na maioria dos casos, deveria ser a palavra final. Depois da morte sobra somente a possibilidade de chorar, sentir saudades e se acalentar no ombro dos que ainda vivem.

A morte é um termo definitivo da existência e dos afetos. Diante dela a fé sente um titubear que vai progredindo até produzir um estado de êxtase e de acomodação.

A fé de Madalena confronta-se com as experiências, ainda sem exceção, que da morte ninguém volta. Os discípulos foram para casa. Estavam apavorados. Este pavor nascia da perplexidade de uma promessa não cumprida, de uma palavra falida ante o inimigo comum da humanidade.

Na fé os discípulos viveram no seguimento do seu Senhor. Também, na fé, deixaram suas casas e seguiram Àquele que nem tinha onde repousar a cabeça. A fé, portanto, era a marca existencial daquela comunidade.

A cena do dia anterior, entretanto, culminava no contraste mais forte que media a dimensão da fé e a ultrapassava infinitamente. Por isso, no amanhecer daquele dia os discípulos estavam dormindo.

Dormir é um modo de acalentar o fulgor da esperança. A esperança insiste em continuar acreditando contra as observações comuns. Quando se trata de alguém que amamos a esperança chega a beirar o abissal, desafia o que é meramente natural, como morrer, e aprofunda raízes em terrenos pouco consistentes.

Dormir representa, portanto, é uma luta para não esperar mais nada.

Logo de manhã Maria Madalena correu até o sepulcro. Ninguém sabia. Ninguém viu nem foi notificado desta proeza.

O sair de Maria Madalena foi sutil, e deslizou por entre a descrença que se instaurara entre os discípulos e foi até o sepulcro.

Do ponto de vista da sanidade esta sutileza é perfeitamente normal. É como um sonhador que aprende a se controlar e a negar as suas visões, muito embora elas lhe apareçam de contínuo e apareçam perfeitamente reais.

O amor, entretanto, não quer saber de nada disso. Não toma conhecimento de nenhum limite! Mergulha na vastidão que ninguém mais vê.

Logo cedo Maria Madalena chegou ao sepulcro, mas ele estava vazio. Doravante as coisas se complicaram. Muitas questões surgiram porque o sepulcro estava vazio.

No passado outras questões tinham sido colocadas. Uma vez os discípulos começaram a discutir quem era o maior no reino dos céus. Se Jesus não tivesse feito sua intervenção esta dificuldade teria consumido a Igreja nascente e destruído totalmente o sonho de um mundo novo.

A palavra do Senhor foi conclusiva: o maior no reino dos céus é o menor entre vós. Desde aquele a dia este discurso tornou se preponderante, mesmo quando desentoa da prática.

Em outra ocasião discutiam se era lícito ou não ao homem abandonar sua mulher. Esta outra confusão teria produzido uma injustiça infinita contra as mulheres, gerando a descrédito total da Igreja à medida que a consciência e o espírito de liberdade crescessem no mundo. Mas o Mestre ainda estava presente, legislou contra qualquer tentativa de se prolongar esta injustiça. Simão Pedro exclamou no final: então a que vale casar-se.

Os assuntos decididos formaram o projeto salvífico da Igreja, mas outras questões se abririam compulsoriamente quando da morte de Jesus.

Se ainda na presença de Jesus era difícil acreditar em algumas revelações, imagina-se a dificuldade que nasceriam das interpretações posteriores. Outra vez, um jovem foi encontrar-se com Jesus e os discípulos e manifestou sua vontade de também se fazer discípulo. Tudo indica que era um jovem bom, tinha fé e era sincero. Após um pequeno diálogo Jesus decidiu que ele deveria vender os seus bens, distribuir entre os pobres e segui-lo. O jovem esmoreceu-se e foi embora.

A questão seguinte alargou-se ainda mais quando Jesus observou que era difícil um rico entrar no reino do céu. Os discípulos perguntaram, então: quem poderá se salvar? Mais uma vez Jesus resolveu facilmente a dificuldade dizendo: para os homens é impossível, mas para Deus não.

Tudo isso acontecia e encontrava respostas imediatas em uma palavra que não poderia ser contestada, porque estava na origem, era a gênese de uma nova proposta, era normativa e ao mesmo tempo concreta.

Jesus era a norma vivente. Mas naquele dia de manhã não estava mais lá. Quando Maria Madalena chegou, como mulher cujo amor havia suspeitado da morte, não encontrou ninguém. O túmulo estava vazio.

O amor foi a ultima coisa que tinha restado. A fé desaparecera, mas o amor continuava operante e chegou antes de qualquer um dos discípulos.

Importante que tenha sido uma mulher a chegar primeiro. Como toda mulher, Madalena tinha superado a descrença sem buscar nada para si. Somente o amor lhe era suficiente. Por isso chegou primeiro.

Amando como fez, não buscou nenhuma explicação. Não tentou justificar nada nem compreender com passagens desgastantes o que o amor a tinha revelado.

Voltou correndo e foi contar a Pedro e João o que tinha visto: retiraram o senhor do sepulcro e não sabemos onde o colocaram!

É verdade o que Madalena fala. O sepulcro está vazio e a esperança renasce em seu coração. Por fim pensa ela, e nós testemunhamos no decorrer do tempo, o amor venceu porque é mais forte que a morte!


Dom Lindomar Rocha Mota
Bispo de São Luís de Montes Belos (GO)

Rússia e Ucrânia

shutterstock 1011237385-1000x450Não existe onde buscar verdadeiras justificativas que dão direito a qualquer autoridade de realizar uma guerra brutal e letal nas dimensões do que vem acontecendo no oriente. A insensibilidade diante da destruição de vidas, de histórias, de projetos, torna-se inconcebível numa cultura universal de progresso, com capacidade de diálogo e negociação. A missão do governo é defender a paz.

É preciso olhar para a cena da travessia do Povo de Deus nas águas do Mar Vermelho, fugindo das atrocidades e autoritarismo praticados pelos Faraós do Egito. O mesmo acontece hoje com o povo da Ucrânia, realizando essa fuga em massa para outros países. As consequências são sempre desastrosas, como a tropa dos Faraós, perdendo carros, cavalos, tropas e homens corajosos (cf. Is 43,17).

Às vezes é preciso perder para ganhar. O Apóstolo Paulo já dizia que preferiu perder tudo para ganhar Cristo. O autoritário nunca admite perder alguma coisa. Pelo contrário, ele quer estar sempre ganhando mais, acumulando desnecessariamente, mesmo sabendo do flagelo humanitário de uma guerra. Como os países dependem uns dos outros, o mundo todo vai ter que pagar caro por essa guerra.

Quem tem quer ter sempre mais, mesmo que custe a vida do outro. A pujança do território russo, de seu desenvolvimento no setor econômico e tecnológico não satisfazem o ego autoritário desse governo. É a política da destruição do outro e de si mesmo, ficando isolado das grandes economias do mundo. As sanções provocadas podem inviabilizar a grandeza da Nação russa, prejudicando a todos.

Há um versículo bíblico que diz assim: “quem julga estar de pé tome cuidado para não cair” (I Cor 10,12). Diz o ditado popular: “Quem muito quer acaba não tendo nada”. O grande perigo é a autodestruição, porque todos estamos no campo das imperfeições e na incapacidade para o domínio total. A única e mais saudável saída é a partilha, a valorização do que é próprio e do que é do outro.

O espírito de guerra pode estar presente na vida de todos nós. Alguns homens apresentaram a Jesus uma mulher adúltera com a intenção de que Ele a condenasse à morte, mas a maldade maior estava neles próprios e não na mulher, porque a fizeram cair em adultério. Jesus agiu com sabedoria dizendo para jogar a primeira pedra quem não tivesse pecado. Todos foram embora (Jo 8,4ss).


Dom Paulo Mendes Peixoto
Arcebispo de Uberaba (MG)

Ensina com amor

Cartaz-2022Na quaresma, a Igreja católica promove a Campanha da Fraternidade propondo a conversão pessoal e social de uma realidade marcada pelo pecado, nas suas expressões de injustiças, omissões e opressões, para uma sociedade fraterna. Em 2022 reflete-se sobre a educação, na certeza de que ela é indispensável para a construção de um mundo mais justo e fraterno. A realidade da educação no Brasil, especialmente marcada pelo flagelo da pandemia da COVID-19, exige uma mudança de mentalidade, reorientação da vida, revisão das atitudes e busca de um caminho que promova o desenvolvimento pessoal integral, a formação para a vida fraterna e para a cidadania.

Esta é a terceira vez que a CNBB aborda essa temática na Campanha da Fraternidade, agora, incentivada pelo Pacto Educativo Global proposto pelo Papa Francisco. Este, visa uma educação humanizada que contribua na formação de pessoas abertas, integradas e interligadas, que sejam capazes de se preocupar, também, por difundir um novo modelo relativo ao ser humano, à vida, à sociedade e à relação com a natureza. Urge reaprender a amar, a perdoar, a cuidar, a curar, a dialogar e a servir a todos. Essa conversão para a fraternidade somente será possível à medida em que Cristo, que nos liberta do egoísmo, for tudo em todos (1Cor 15,22).

O número 22 do texto-base da Campanha da Fraternidade expressa essa relação entre Cristo e a educação que se propõe neste momento de crise: “Educação não é condicionamento ou adestramento. É conduzir e acompanhar a pessoa para sair do não saber, rumo à consciência de si mesma e do mundo em que vive. É tornar a pessoa consciente, para que se torne sempre mais sujeito de seus sentimentos, pensamentos e ações. Isso vale tanto para crianças como para adultos, uma vez que a própria vida se encarrega de nos trazer oportunidades de aprendizagem em qualquer etapa. Uma pessoa se torna sujeito na medida em que pode dialogar com outras, percebendo que é levada a sério, que é escutada e amada”.

Enfim, a Campanha da Fraternidade destaca dois aspectos fundamentais: o valor da pessoa como princípio da educação e o sentido do ato de correção, que é conduzir ao caminho reto. Não é repressão, mas é orientar a pessoa no caminho de uma vida transformada, verdadeiramente convertida à luz da verdade. Essa consciência de que há uma emergência educativa em nosso mundo, e especialmente no Brasil, reflete bem o que escreveu o Papa Francisco na Laudato Sí, apelando para uma conversão de vida: “a educação será ineficaz e os seus esforços estéreis, se não se preocupar também por difundir um novo modelo relativo ao ser humano, à vida, à sociedade e à relação com a natureza» (n. 215).

A Campanha da Fraternidade 2022 expressa o empenho por uma educação humanizadora capaz de ensinar com amor, como preconizou Hannah Arendt: “a educação é o momento que decide se nós amamos suficientemente o mundo para assumir a responsabilidade e assim salvá-lo da ruína, que é inevitável sem a renovação, sem a chegada de novos seres, de jovens”.


Dom Leomar Antônio Brustolin
Arcebispo de Santa Maria (RS)

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