Outra vez Ideologia de Gênero
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- Terça, 28 Março 2017 13:52
Sei que há opiniões divergentes. A questão “gênero” é uma das polêmicas mais debatidas na atualidade. O que deverá prevalecer? As correntes do modismo, os interesses particularizados de minorias, ou o bom senso da razão? O que se está propondo (ou impondo) é uma revolução dos conceitos e dos costumes. As revoluções podem ser boas ou más, mudar para melhor ou para pior. Elas são geralmente resultado de uma ideia que, de alguma forma, pegou. Porém, também nem sempre o que pegou é bom. A ideias nazistas e fascistas pegaram, à época, mas não eram boas e geraram guerra mundial. As consequências vão demonstrar onde está a verdade. Mas, pela experiência da história, podemos evitar desastres desnecessários.
O critério para decisões nas horas acaloradas não pode ser outro senão o respeito à ordem natural das coisas, à dignidade das pessoas e à legitimidade do método. No caso da agenda de gênero, parece-me haver vários enganos que poderão causar danos irreparáveis. Em primeiro lugar, afirmar que ninguém nasce homem ou mulher e que ser uma coisa ou outra reduz-se a papéis atribuídos pela sociedade, é evidente e clamoroso equívoco, uma vez que desconsidera, como se não tivesse nenhuma relevância, o dado biológico, que é constitutivo do ser humano e o faz concretizar a essência humana como homem ou como mulher.
Há muitas coisas que são resultado da construção social, o que equivale a dizer que há muitas injustiças sociais que devem ser superadas pela reconstrução de papéis sociais atribuídos pela sociedade. Mas isso, de modo algum, autoriza-nos a desconsiderar o dado natural e sua relevância moral. Por natureza, os seres vivos são criados machos e fêmeas, e isso não é apenas um acaso, mas a ordem natural que possibilita a procriação e a harmonia entre os seres vivos. A natureza já nos dá certas determinações, e isto não pode ser simplesmente desprezado ou encarado como uma agressão da mesma. Há coisas que devem ser recebidas como um dom e não como imposição. Seria uma deformação psicológica ver em tudo opressão. Você, se nasceu no Brasil, nasceu brasileiro, se nasceu no Japão, será sempre japonês. Ainda que você, por opção, se naturalize em outro país, a sua origem nunca poderá ser negada. Há, portanto um dado original que lhe determina a existência.
No campo da sexualidade, se ao caminhar da vida algo de diferente apareceu na dimensão psicológica ou em opções pessoais, trata-se de caso especial e deve ser visto, respeitosamente, como tal. As pessoas não têm culpa de terem esta ou aquela tendência. Mas é preciso tratar as coisas com objetividade. Se você, por exemplo, se sente japonês num corpo brasileiro, todos o respeitarão, mas seria um contrassenso exigir que a todos nasçam sem nacionalidade ou naturalidade definida, e tentar criar legislação que proibisse todas as pessoas de se reconhecerem como tais, dando-lhes o pseudodireito, antinatural, de esperar ter a idade da razão para saber se quer ser brasileiro, japonês, ou ter qualquer outra naturalidade.
Se, em linha de princípio, se deve o respeito às opções, é necessário observar que a liberdade de optar tem limites e consequências. Mesmo as opções por algo que julgo bom devem ser averiguadas. É preciso saber se vão causar danos a alguém, ao grupo humano de que fazemos parte e até à humanidade inteira. Por exemplo, a opção pelo desmatamento pode ser julgada por alguém como algo bom, pois poderá gerar lucros e para estes autores da desflorestização o lucro é tentador. Mas, sabemos que tal ato causa um grande prejuízo ao meio ambiente e gera situações de morte para pessoas humanas e outros seres vivos.
Os métodos para fazer prevalecer ideias devem ser legítimos e respeitosos. Não me parece que isto esteja acontecendo com relação à ideologia de gênero. A instrumentalização da mídia com casuísmos dramáticos, com exemplos particularizados, a forma de impor tal agenda nos planos de municipais de educação, de juventude, da mulher e outros, além do uso de material didático, verdadeira literatura pornográfica já distribuída nos últimos anos sem nenhum consenso da sociedade, não tem nada de democrático.
O direito das famílias de educar seus filhos conforme suas consciências e suas crenças é totalmente desprezado, não lhe reconhecendo nenhum direito de falar, de argumentar ou de optar por algo que lhe seja valor inalienável. Em geral, quando as vozes que defendem a família se levantam, são pejorativamente criticadas com termos como conservadorismo, homofobia, atitude contra os direitos das mulheres e outros.
Aos cristãos, sejam católicos ou evangélicos, constituidores da grande maioria do povo brasileiro, eu ofereceria a Palavra do Senhor que nos chamam a lutar com destemor: “No mundo tereis provações. Mas tende coragem! Eu venci o mundo” (Jo 16, 33). Já enfrentamos coisas piores na história, mas sempre venceu o bom senso e a ordem estabelecida por Deus. No espírito da Quaresma que prepara a Páscoa, lutemos com as aramas da paz e da justiça, do respeito, da coragem e do amor, certos de que a vitória será da vida, pois Cristo venceu o pecado e a morte, ressuscitou e está vivo para sempre.
Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora
O Dia em que o Carnaval Rezou
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- Quinta, 09 Março 2017 13:36
Entre algumas polêmicas, opiniões convergentes ou divergentes, o carnaval de São Paulo homenageou Nossa Senhora, sob precisas orientações da Arquidiocese local, comemorando os 300 anos do encontro da imagem de Aparecida.
Sem entrar na disputa do tema, quero apenas destacar os aspectos positivos que julgo importantes. O Brasil nunca havia visto algo igual. Em pleno desfile, onde antes eram quase obrigatórias cenas de despudor, com exibição inconveniente do corpo humano, haver uma escola de Samba que renunciasse a isto e a outros excessos, para homenagear, respeitosamente, o lado religioso do povo, é mesmo coisa inédita. O que se viu foi um espetáculo de rara beleza, exuberância de arte expressa na música, nos tambores, nas coreografias, no visual de roupas e carros alegóricos evoluindo em desfile na avenida do samba com variadas expressões de amor e devoção à Mãe de Jesus. Aos blocos se deu o nome de Preces. Ouviu-se no enredo um verdadeiro hino à Padroeira, quando o povo cantou: Aos teus pés vou me curvar, Senhora de Aparecida, a prece de amor que nos uniu: Salve a Rainha do Brasil... Oh Senhora, Oh Senhora, reluz teu manto azul bordado em ouro: a bênção de viver a tua glória!
As referências aos pescadores tricentenários, aos milagres, às súplicas dos aflitos, aos afro-descendentes, às ofertas votivas da amada Princesa Isabel, ao Santuário e tudo mais marcaram o grande espetáculo como verdadeira procissão de louvores e ações de graças. A ausência de nudismo e de sincretismo, pedidos pela comissão examinadora da Igreja, à solicitação da “Unidos da Vila Maria”, marcou um carnaval diferente, onde se descobriu que para se alegrar nos três dias do Momo, não são necessários exageros e nem cenas inconvenientes. A paz que se sentiu na hora das evoluções pela avenida demonstrou que é possível um carnaval sem violência e sem excessos.
Alguns protestos anteriormente quase agressivos caíram, ao menos em parte, observando o outro lado da questão. Viu-se que, na verdade, carnaval não é só pecado, mas tem muito de arte e de mensagem e pode até se transformar em prece.
Os enredos quando se referem aos cuidados com a ecologia, protegendo a natureza e a vida, ou quando exaltam figuras de nossos literatos, poetas, cantores, compositores, pintores, escultores, arquitetos ou outros artistas que formam o patrimônio intangível e moral de povo brasileiro, ou quando relembram momentos de nossa história, são verdadeiras lições que, às vezes, ensinam mais que nossas escolas ou faculdades. Neste extraordinário espetáculo brasileiro, apreciado por muita gente no estrangeiro, as mensagens podem enriquecer o conhecimento, despertar atitudes positivas sobre lacunas sociais, e indicar caminhos novos para o comportamento humano.
Não seria generalização preconceituosa considerar o carnaval apenas festa da carne, um festival de orgias ou abusos? Talvez Dom Helder Câmara tivesse, ao menos em parte, razão, quando ele dizia: Carnaval é alegria popular. Direi mesmo, uma das raras alegrias que ainda sobram para a minha gente querida.
Sou de opinião que, quanto a carnaval, deve-se fazer distinção: há um jeito de brincar, de se alegrar, de dançar que não é pecaminoso. Seria injusto considerar generalizadamente pecadores os que brincam o carnaval. Lembro-me que, quando criança, via acontecer nestes três dias que antecedem a Quaresma, cenas de brincadeiras como jogar água ou puxar cordão, cantando folguedos, coisas que não se fazia em nenhuma outra época do ano. Nada havia de estranho nisso. Era, muitas vezes, ocasião de reforçar amizades ou de reatá-las, pois ninguém se irritava quando ganhava um balde de água que lhe molhasse o corpo inteiro ou um monte de confetes que lhe agarrassem ao suor. Naqueles dias não prevaleciam tanto as regras de comportamento, mas eram momentos de descontração, sabendo-se que na vida não se precisa resolver tudo a ferro e fogo, e que o humor também é criatura de Deus. Que Ele nos livre de uma vida sem humor!
Se Deus Pai Misericordioso enviou seu Filho que se fez homem, Verbo Encarnado que se misturou com gente pecadora deste mundo, em tudo sendo-lhe igual, menos no pecado; se Cristo entrou na casa de impuros, causando estranheza aos fariseus e a outros; se o Senhor não considerou a rigorosa lei do Sábado, para poder, em seu lugar, fazer o bem, se louvou a fé de pessoas que nem pertenciam ao seu povo; por que estranhar que se possa prestar louvores a nossa Santa Mãe e Padroeira numa festa que mexe com o Brasil inteiro? Oxalá todas as escolas imitassem a feliz iniciativa da “Unidos da Vila Maria”! O carnaval seria outro e as famílias agradeceriam.
No meu entender, desta vez, a entrada da festa do samba em São Paulo, foi o dia em que o Carnaval rezou.
Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora
Nossa Senhora Aparecida: 300 anos!
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- Quinta, 23 Fevereiro 2017 08:54
Foi nos meados de outubro de 1717 que três pescadores encontraram, entre suas redes, a pequena imagem negra da Beatíssima Virgem Maria, que se tornou principal ícone de devoção sempre crescente do povo brasileiro. Desde o princípio, os moradores da região costumaram referir-se a ela como Nossa Senhora da Conceição Aparecida ou simplesmente Nossa Senhora Aparecida.
Ao correr do tempo, orações, celebrações, escuta da Palavra de Deus, súplicas em situações de extrema dificuldade se repetiram, subindo a Deus como suave incenso, resultando em graças alcançadas e milagres verdadeiros. O aumento do movimento popular gerou sucessivas construções de espaços cada vez mais amplos para o povo local e peregrinos de várias partes. De uma simples sala na casa de Felipe Pedroso, da pequena capela no morro dos Coqueiros, edificações sucessivas foram surgindo até se chegar ao extraordinário Santuário Nacional, o maior do mundo construído em louvor da Virgem Maria, sagrado solenemente pelo inesquecível Papa São João Paulo II, no ano de 1980, em sua primeira viagem ao Brasil.
Ocorrendo frequentes milagres de Deus por intercessão da Virgem Mãe de Cristo, a devoção foi se tornando cada vez mais centro de piedade popular, reconhecida repetidas vezes pelas autoridades eclesiais, configurando-se como autêntico e forte elemento evangelizador e santificador.
Para isso, contribuiu a iniciativa pioneira de Dom Silvério Gomes Pimenta, o primeiro bispo negro do Brasil, Bispo e posteriormente Arcebispo de Mariana, em Minas Gerais, que em 1893 trouxe para a cidade de Juiz de Fora, hoje sede de nossa Arquidiocese, a Congregação dos Padres Redentoristas. Tal iniciativa foi secundada pelo Bispo de São Paulo, Dom Joaquim Arcoverde de Albuquerque Cavalcanti que, no ano seguinte, conseguiu na Baviera, a vinda de Redentoristas para a sua diocese, colocando-os em Aparecida, ampliando assim o trabalho catequético, evangelizador e missionário, além da assistência cotidiana dos Sacramentos. Concretiza-se assim o ideal do fundador, Santo Afonso Maria de Ligorio, que era de evangelizar os abandonados.
Como já referido em outro artigo de nossa autoria, não há dúvidas que o maior de todos os milagres acontecidos em Aparecida tem sido a inexplicável força deste singelo símbolo. Uma imagenzinha de 36 centímetros, de terra-cota, já considerada desprezível, atirada em dois pedaços no fundo de um rio, apanhada por humildes pescadores, vem arrastando crescentes romarias, chegando hoje a multidões incalculáveis que buscam o Senhor, na casa de Maria. A IX Romaria do Terço dos Homens, a acontecer no próximo sábado, 18 de fevereiro, já conta com inscrição de mais de 70 mil pessoas. A devoção a Maria foi sempre cristológica, sabendo-se que quem busca Maria, a busca por ser mãe de Jesus, o Divino Salvador, tendo profundo sentido bíblico.
Diz Moisés Alves dos Santos, comentarista das agendas da editora Ave Maria, falando das experiências de fé em Aparecida: A “aparição” de Maria em terras brasileiras é simples... O extraordinário é que se tornou essa experiência fundante: quantas conversões, quantas promessas, quantas curas! ... É próprio de Deus atuar a partir de uma experiência simples. Foi assim que Abraão foi chamado para ser pai de uma grande multidão, após uma simples experiência com o céu estrelado. Foi assim também que Jeremias aderiu à sua missão, após ter a visão de uma “panela fervendo”. (Agenda Ave Maria, 2017, 12 de outubro).
Podemos acrescentar à reflexão as contínuas atitudes de Jesus, que empregava elementos muito simples para suas pregações, a fim de comunicar verdades de grande profundidade. Assim foi com a semente de mostarda, com um pouco de lama feita com a sua saliva e um pouco de terra para curar o cego de nascença, e o pão, o mais comum dos alimentos, para instituir o mais sublime dos Sacramentos que é a Sagrada Eucaristia.
Os elementos materiais, tão pequenos a aparentemente insignificantes, tornam-se pela forma simbólica, a causa de coisas imensamente maiores, sobrenaturais, transformadoras, edificadoras, força e intermediação da Salvação. Só Deus pode fazer isto!
Maria, a humilde serva, jovenzinha de Nazaré, foi escolhida pela iniciativa divina para ser o canal intermediador da Salvação, sendo mãe do Filho de Deus encarnado. Sua singela súplica nas Bodas de Caná resultou no primeiro milagre de Cristo, o início de sua vida pública, segundo o evangelho de São João.
A ação de Maria, pelo divino desígnio dos mistérios de Deus, prossegue realizando a obra misericordiosa do Pai, que após 300 anos, vem atraindo e acolhendo o povo fiel do Brasil, na conta de seus filhos queridos.
Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora
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