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O encanto dos ipês

b76afc35edc6a6ca1286ce5711a245c6A primavera chega com força e com o irresistível fascínio que esta estação traz ao nosso olhar. No início de setembro, viajando pelo interior do Rio Grande do Sul, em companhia de minha mãe e de amigos, ao longo das rodovias, passamos por vários trechos ladeados por exuberantes ipês floridos. Nas redes sociais, muitos usuários faziam questão de postar suas fotos, como que num concurso de qual delas mereceria mais “likes”, as famosas curtidas. Não faltaram as expressões para exaltar a beleza. Dentre elas: “os ipês, de tirar o fôlego!”. Quanto mais variados e intercalados, entre roxos, amarelos e até brancos, que são mais raros, o mosaico de fotos só enalteceu e confirmou o encanto dos ipês.

O mês de setembro, além dos ipês, traz o início da primavera, quando a natureza explode em vida: renovação das árvores, beleza das flores, o gorjeio das aves, que buscam renovar as gerações construindo novos ninhos. A vida fala! Para a humanidade, a juventude representa força e esperança. Depois do longo inverno da pandemia, é nela, na juventude, que depositamos o futuro. Claro, todos somos humanidade, e todos temos a mesma grandeza de vida. Mas é ela a idade mais vigorosa, de explosão hormonal, da criatividade intelectual, da qual espera-se novos inventos, novos rumos e novos caminhos. Depois da hibernação, neste longo período da pandemia, é o jovem que carrega em seu bojo histórico, um sonho de um mundo renovado. Haverá o pessimista que vê nos jovens a apatia, ensimesmamento e falta de rumo. A pandemia impôs a todos muitas incógnitas e medos, mas é possível esperar. Sim! E o Papa Francisco tem repetido em tantas oportunidades: “Não deixemos que nos roubem a esperança!” Juventude é olhar para frente. É broto de vida nova. É esperar com os pés no chão: políticas de incentivo ao estudo e à ciência; abertura de postos de trabalho que permitam aos jovens permanecerem no país; espaços na política, na economia, na Igreja, onde possam colocar em ato as forças renovadoras do tecido social. E quanto mais diversidade, mais riqueza e mais beleza. Como o encanto dos ipês.

Eu-nao-nosNa esteira da primavera e da juventude, celebramos o 107º Dia Mundial do Migrante e do Refugiado, no dia 26 de setembro. Neste ano, o Papa Francisco nos convida a refletir: “Rumo a um ‘nós’ cada vez maior”. Os desafios do mundo em movimento, as incertezas, dores, sofrimentos e mortes, que marcam as trajetórias e os sonhos destes nossos irmãos e irmãs, nos colocam no caminho do encontro como humanidade. Vencendo a tentação da xenofobia e das variadas formas de discriminações, somos convidados a olhar o mundo, inspirados no coração de Deus-Trindade. Comunhão que gera vida. Os humanos – nós – somos “imagem e semelhança deste Deus” – unidade na diversidade do amor. A grandeza do “eu” é a capacidade de abrir-se ao “nós”. Encontro com o outro diferente. A comunhão de raças, culturas, línguas e expressões religiosas revela a beleza da raça humana. O encontro e a hospitalidade engrandecem a humanidade. Ah, os ipês! Seu encanto é ainda mais belo na diversidade das cores e tamanhos. Ao cruzar este tempo de pandemia, renovemos o compromisso de uma humanidade melhor. É um sonho?! Mas é típico do jovem sonhar, buscar, desafiar. Encantar-se com a humanidade. Há um novo florescer. A maravilha dos ipês. Um só já é belo. Juntos são irresistíveis. Viva a beleza da juventude. Por que não dizer isto da humanidade?! “Rumo a um ‘nós’ cada vez maior”!


Dom Adilson Pedro Busin

Bispo auxiliar de Porto Alegre (RS)

Trezentos anos de Igreja em São João del-Rei

Catedral-do-Pilar-Sao-Joao-del-Rei-2Na última semana, tive a alegria de iniciar o tríduo preparatório para a celebração dos 300 anos da licença concedida pela então Diocese do Rio de Janeiro para se construir a Matriz do Pilar, em São João del-Rei. Foi exatamente no dia 12 de setembro de 1721. Tal Matriz transformou-se em Catedral no dia 21 de maio de 1960, quando foi criada a Diocese, pela bula “Quandoquidem novae”, do Papa São João XXIII. Ao redor desta igreja, construída num tempo recorde de três anos, sem ainda os artísticos altares, cresceu a cidade, sendo ela, hoje, o marco histórico mais importante desta vetusta comuna mineira, de tão ricas tradições.

Louvo a iniciativa de Dom José Eudes Campos do Nascimento, coadjuvado pelo Pároco desta paróquia, Padre Geraldo Magela da Silva, pela feliz iniciativa de celebrar esta efeméride. Isso porque o documento assinado pelo cônego Gaspar Ribeiro Pereira em tempo de vacância diocesana é como a certidão de autenticidade da fé cristã daquela povoação inicial. É também básico para o que veio sendo construído, não só fisicamente, mas muito mais, com a importância do campo espiritual, tudo o que pastoralmente veio crescendo ao redor desta igreja e dentro dela através dos tempos, até chegar aos nossos dias. Em 1965, o Papa São Paulo VI agraciou e valorizou a Catedral Nossa Senhora do Pilar com o título de Basílica Menor, unindo-a, portanto, de maneira especial, ao coração do sucessor de Pedro.

Os templos cristãos são simbólicos

A construção das igrejas no mundo católico é um ato de louvor ao Pai e aos irmãos, um monumento àquilo que deve ser a nossa vida e a vida do povo. Nós construímos igrejas com arte e beleza, pois não são construções quaisquer, são muito especiais; aliás, as mais especiais para quem é dotado pela graça da fé. Construímos porque Deus merece o melhor e queremos oferecer a Ele o que há de mais belo, de mais valioso.

O Santo Padre São João Paulo II, em 1993, em seu Motu Proprio Inde a Pontificatus Nostro initio, afirmou: “a fé tende, por sua natureza, a exprimir-se em formas artísticas e em testemunhos históricos que têm uma intrínseca força evangelizadora e valor cultural, diante dos quais a Igreja é chamada a prestar a máxima atenção”. A Igreja sempre valorizou a arte como veículo de comunicação das coisas espirituais e como expressão catequética. As igrejas falam por si no silêncio das suas belezas, como nos indica a expressão do Credo Niceno-Constantinopolitano “Visibilia ad Invisibilia” (do visível para o invisível).

Porém, mais importante do que a arte, as formas ou o ouro que vemos no templo são-joanense, é o sentido espiritual de tudo isto. A arte é um veículo que nos leva ao essencial, que é Cristo. Tudo isto existe única e exclusivamente para Ele, para louvá-Lo, celebrar os Seus mistérios, ouvir a Sua palavra, para expressar o nosso amor incondicional a Ele.

As edificações sacras perenizam a Igreja

A arquitetura sacra é também imagem da Igreja viva, feita por nós. Olhando para aquela igreja, imaginamos quantos fiéis estão historicamente presentes nela: atrás de suas paredes ornamentadas e bem pintadas, estão pedras, tijolos escondidos; são a imagem dos nossos irmãos antepassados que ali estiveram e agora estão na Igreja celeste.

Assim nós celebramos essa data tão importante, não só para a cidade ou a Diocese de São João del-Rei, não só para a Província Eclesiástica de Juiz de Fora, mas para todo o Brasil, para todo o mundo, para os quais ela é, de fato, uma expressão do amor de Deus.

Que ali a liturgia seja sempre exuberante, porque a liturgia da Terra deve ser uma imagem, ainda que pequena e pálida, da grande liturgia do céu. Preparados pela beleza daquele templo de 300 anos de idade, caminhemos com olhos fixos na Trindade Santíssima, para que um dia gozemos da felicidade e da beleza que Deus preparou para todos aqueles que O amam.


Dom Gil Antônio Moreira
Arcebispo Metropolitano de Juiz de Fora

Cruz: Símbolo de Vida e de Esperança

cruz. com luzA cruz é um símbolo presente em distintas culturas. Não foi o cristianismo que a descobriu. No entanto, foi a partir do evento cristão que a cruz adquiriu simbologia própria. Ela passou a ser símbolo da vitória do amor sobre o ódio do mundo, manifestado num processo injusto e numa execução sumária do homem, que “passou fazendo o bem” (At 10,38) e que “fez tudo bem” (Mc 7,37).

Gregório de Nissa (+ 394) afirmava que a cruz anuncia a verdade do cosmos e do ser humano. Na sua verticalidade e na sua horizontalidade ela abraça toda a realidade. “Estás estendida para a direita e para a esquerda para rechaçar o terrível poder do inimigo e reunir o mundo. E está enraizada nas profundezas da terra, para ligar com o céu aquilo que está na terra e embaixo da terra. (…) Ó nome da cruz, que abraças em ti o universo. Salve a ti, ó cruz, que mantém unidos o cosmos em sua extensão” (H. Rahner).

É um costume difuso traçar sobre si ao se passar diante de uma igreja o sinal da cruz. Há quem inicia a jornada e a encerra fazendo e rezando o sinal da cruz. Com isso, a pessoa não apenas traça a cruz sobre si, ela também reza na postura da cruz. O gesto da cruz é o gesto mais antigo da oração cristã. É o sinal da totalidade e da redenção. Quando, rezando, o traçamos sobre nós, estamos nos marcando e nos deixando envolver pelo mistério redentor atualizado na cruz.

Para os cristãos, o sinal da cruz é o sinal mais santo que existe. Fazendo-o, tudo o que somos, corporeidade, pensamento, espírito, vontade, sentimentos, ocupações e atos, é assinalado, consagrado na força do Cristo Crucificado-Ressuscitado.

Os cristãos se definem pela cruz. A cruz que trazemos junto ao corpo, ou a cruz fixada em espaços privados ou públicos nos recorda em todas as circunstâncias que estamos envolvidos pelo amor de Deus que se abaixou, se fez carne, para participar de nossa condição, para nos tocar e nos curar em nossos aspectos mais vulneráveis. Há certamente aspectos e situações em nós e na sociedade que necessitam urgentemente de cura. Daí a premência de resgatar o lugar da cruz em nossa vida e em nossa sociedade.


Dom Jaime Spengler
Arcebispo de Porto Alegre
Primeiro vice-presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB)

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