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A crise no Brasil

bandeira-brasilO povo brasileiro está vivendo um dos momentos mais intensos de sua história, com esperanças, mas também com sofrimentos e perigos. Na esteira da democracia, muitas tendências emergem, graças a Deus, sem violência, algumas muito positivas e promissoras, outras preocupantes, nos seus termos e nos seus métodos. Democracia é assim mesmo. É oportunidade de todos manifestarem suas opiniões e provarem suas teses. Por esse meio, o povo vai conhecendo melhor os seus governantes, como também os métodos justos ou injustos presentes na vida da política do País. É ocasião de rever, de corrigir, de propor, de decidir. O critério da maioria é uma característica da democracia, por isso as regras têm que obedecer aos princípios. Não se pode pensar em democracia se, para se eleger, seja necessário o emprego desordenado do dinheiro ou de inverdades e enganos propositais. Isso seria pseudo-democracia.

O núcleo da atual crise está na corrupção que se tornou endêmica no país, chegando, nos últimos tempos, a níveis insuportáveis.

Sobre a presença da Igreja nesta hora brasileira, gostaria de propor ao caro leitor, trechos do Magistério Eclesiástico, algumas já citadas também por nosso irmão no episcopado, Dom Fernando Rifan, Bispo da Administração Apostólica Pessoal São João Maria Vianney, em seu interessante artigo ‘Momento Político’.

É importante recordar o que ensinou Bento XVI em sua encíclica Deus Caritas Est: “A Igreja não pode nem deve tomar nas suas próprias mãos a batalha política... não pode nem deve se colocar no lugar do Estado. Mas também não pode nem deve ficar à margem na luta pela justiça. Deve inserir-se nela pela via da argumentação racional e deve despertar as forças espirituais, sem as quais a justiça... não poderá firmar-se nem prosperar” (Deus Caritas Est, 28). Também o Papa Francisco tem ensinado que “Todos os cristãos, incluindo os Pastores, são chamados a se preocupar com a construção de um mundo melhor” (Evangelium Gaudium183).

A Igreja não deseja que os seus ministros ordenados se candidatem a cargos políticos e nem se filiem a partidos, para, inclusive, não correrem o risco de macularem a pregação da Palavra, uma vez que facilmente os púlpitos poderiam se transformar direta ou indiretamente em palanques eleitoreiros. Ela tem princípios, mas não faz opções partidárias. Tem o direito, como qualquer grupo ou qualquer cidadão, de analisar os programas de cada partido e indicar a seus fiéis o que é compatível com a fé cristã e o que não o é, assim como também tem o dever de esclarecer sobre a oportunidade ou não de eleger certos candidatos que não merecem sua confiança, sobretudo os que têm sua “ficha suja”.

Se a Igreja não deseja que seus padres ou bispos se candidatem, ela orienta aos fiéis leigos que o façam com dignidade e determinação, como ensinou São João Paulo II: “Os fiéis leigos não podem absolutamente abdicar da participação na política, ou seja, da múltipla e variada ação econômica, social, legislativa, administrativa e cultural, destinada a promover orgânica e institucionalmente o bem comum.” (Christifidelis Laici, 42).

Sobre o impeachment da Presidente, a 54ª. Assembléia da CNBB afirmou que “a crise atual evidencia a necessidade de uma autêntica e profunda reforma política, que assegure efetiva participação popular, favoreça a autonomia dos poderes da República, restaure a credibilidade das instituições e garanta a governabilidade”. Também ficou claro que a Igreja não deseja emitir juízo jurídico ou político, certa de que tal procedimento não cabe a ela, mas às instâncias competentes do Estado.

Para evitar certas interpretações não condizentes com a Doutrina Social da Igreja, recordemos o que afirmou Paulo VI: “Há cristãos, hoje em dia, que se sentem atraídos pelas correntes socialistas e pelas suas diversas evoluções. Eles procuram descobrir aí certo número de aspirações, que acalentam em si mesmos, em nome da sua fé..., contudo, tal corrente foi e continua a ser, em muitos casos, inspirada por ideologias incompatíveis com a fé cristã... (Octogesima Adveniens, 31).

As confusões aludidas por Paulo VI perduram ainda hoje, porém cada vez em menor número, seja por ter havido amadurecimento na análise dos fatos históricos que revelaram o insucesso de teorias marxistas em vários lugares, seja por aprofundamento na reflexão sobre a relação da fé cristã com teorias sociais. Já houve quem dissesse que entre cristianismo e marxismo pode haver alguma coisa em comum, pois ambos desejam tratamento igualitário para os seres humanos, porém há uma diferença fundamental: enquanto Marx diz: “o que teu é meu”, Cristo diz: “o que é meu é teu”. Isto muda tudo na compreensão dos fatos e nos métodos.

Nesta hora brasileira, o mais importante é a esperança, a luta fiel contra a corrupção esteja ela onde estiver. Que tudo se realize em paz, sem violência, na busca de uma comunidade nacional justa, fraterna, progressista, respeitadora dos legítimos direitos da pessoa humana, inclusive o de professar livremente a fé.

                                                         Dom Gil Antônio Moreira
                                                 Arcebispo Metropolitano de Juiz e Fora

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